quarta-feira, 23 de julho de 2008

Conto de Olavo Bilac

COMO OS CÃES
Olavo Bilac

— Não é possível, senhora! — dizia o comendador à esposa — não é possível!

— Mas se eu lhe digo que é certo, seu Lucas! — insistia a D. Teresa — pois é mesmo a nossa filha quem m’o disse!

O comendador Lucas, atônito, coçou a cabeça:
— Oh! senhora! mas isso é grave! Então o rapaz já está casado com a menina há dois meses e ainda...

— Ainda nada, seu Lucas, absolutamente nada!

— Valha-me Deus! Enfim, eu bem sei que o rapaz, antes de casar, nunca tinha andado pelo mundo... sempre agarrado às saias da tia... sempre metido pelas igrejas.

— Mas — que diabo! — como é que, em dois meses, ainda o instinto não lhe deu aquilo que a experiência já lhe devia ter dado?! Enfim, vou eu mesmo falar-lhe! Valha-me Deus!

E, nessa mesma noite, o comendador, depois do jantar, chamou à fala o genro, um moço louro e bonito, dono de uns olhos cândidos...

— Então, como é isso, rapaz? tu não gostas de tua mulher?

— Como não gosto? Mas gosto muito!

— Tá tá tá... Vem cá! que é que tu lhe tens feito, nestes dous meses?

— Mas... tenho feito tudo! converso com ela, beijo-a, trago-lhe frutas, levo-a ao teatro... tenho feito tudo...

— Não é isto, rapaz, não é somente isso! o casamento é mais que alguma cousa! tu tens de fazer o que todos fazem, caramba!

— Mas... não entendo...

— O´ homem! tu precisas... ser marido de tua mulher!

— ... não compreendo...

— Valha-me Deus! tu não vês como os cães fazem na rua?

— Como os cães? ... como os cães?... sim... parece-me que sim...

— Pois, então? Faze como os cães, pedaço de moleirão, faze como os cães! E não te digo
mais nada! Faze como os cães...!

— E, ao deitar-se, o comendador disse à esposa, com um risinho brejeiro:

— Parece que o rapaz compreendeu, senhora! e agora é que a menina vai ver o bom e o
bonito...

*
* *
Uma semana depois, a Rosinha, muito corada, está diante do pai, que a interroga. O
comendador tem os olhos esbugalhados de espanto:


— Que, rapariga? pois então, o mesmo?

— O mesmo... ah! é verdade! houve uma coisa que até me espantou... ia-me esquecendo...
houve uma cousa... esquisita...

— Que foi? que foi? — exclamou o comendador — que foi?... eu logo vi que devia haver alguma cousa!

— Foi uma cousa esquisita... Ele me pediu que ficasse... assim... assim... como um bicho... e...

— E depois? e depois?

— E depois... depois... lambeu-me toda... e...

— ...e?

— ... e dormiu!


Fonte: DomínioPúblico

2 comentários:

Eliete disse...

Olavo Bilac era humorista também?
Esse conto é uma piada!

Yerko Herrera disse...

Agradeço o comentário. Mas, sinceramente, não entendi se é uma critica ou elogio. De qualquer forma, caso esteja em dúvida a procedência deste conto, garanto que não é um texto apócrifo. Caso esteja interessada, o livro de Olavo Bilac que contém este conto, e muitos outros, esta disponível completo na internet.

Toda obra dele é de domínio público, e o saite que o dispõe é um saite do Governo Federal. Entre em http://www.dominiopublico.gov.br e lá procure por Olavo Bilac, o livro se chama "Contos para Velhos".

Um grande abraço e obrigado pelo comentário. Volte sempre, qualquer dúvida escreva.

Yerko Herrera.