sábado, 12 de janeiro de 2008

O Rock Brasil Anos 80 e sua importância

Anos 80: o paradoxo estendido na areia

por Paulo Bap



Titãs, Barão Vermelho, Paralamas do Sucesso e Legião Urbana

Com Eduardo e Mônica perto de completarem bodas de prata, vale a pena recordar o que acontecia quando eles se conheceram. Aquela festa estranha, com gente esquisita, não tinha uma trilha musical tão inovadora em termos de sonoridade, mas tornou-se uma identidade, imagem da juventude da época. Uma imagem tosca, mas real, talvez a única possível, diante das circunstâncias.

Tudo começou com Evandro Mesquita que, vindo do grupo Asdrúbal Trouxe o Trombone, trouxe a linguagem teatral à sua banda Blitz, suas apresentações em palco e suas canções, a partir de “Você não soube me amar” que, em 1982, abriu as portas para o denominado BRock. Do grupo de teatro, também fazia parte a camaleoa Regina Casé. Da banda, Lobão e a carioca Fernanda Abreu. Marina Lima, Ritchie e Lulu Santos chegaram sozinhos, os dois últimos vindos de um grupo não muito conhecido, de nome Vímana, junto com Lobão. Num cantinho, meio deslocada, uma turma fazia uma festinha paralela: 14 Bis, Boca Livre e Roupa Nova.

Sem microcomputador, internet, telefone celular, CD e MP3, a informação era menos acessível. A televisão acabava de entrar na era dos vídeo-clips e as bandas de sucesso tocavam na rádio Fluminense e no Circo Voador, ambos no Rio de Janeiro, e apresentavam-se em programas de auditório como o Cassino do Chacrinha, da Rede Globo. Rolava de tudo: Miquinhos Amestrados, Abóboras Selvagens, Kid Abelha, Kid Vinil, Absyntho, Herva Doce, Sempre Livre, Camisa de Vênus. Difícil descrever, por exemplo, a loucura que era a apresentação dos Titãs, com seus oito integrantes se espalhando pelo pequeno palco em performances alucinantes, em meio à gritaria do auditório, estripulias de Chacrinha, toques de sirene e requebros das chacretes.

O Rock in Rio I, ocorrido em janeiro de 1985, ajudou a consolidar o BRock como algo rentável para as gravadoras e, por conseqüência, a disseminar o surgimento de bandas que apareciam por todas as bandas, de qualidade ou não. Mesmo não fazendo parte de suas atrações, os grupos Titãs, Legião Urbana, Ultraje a Rigor e RPM alcançaram um maior destaque após o festival, o qual ajudou, também, a alavancar a carreira de grupos que já se destacavam, como Kid Abelha, Blitz, Paralamas do Sucesso e Barão Vermelho, este último protagonista de um de seus melhores momentos, quando Cazuza cantou, abraçado à bandeira brasileira, “Pro dia nascer feliz”. Era o dia da votação que elegeria Tancredo Neves presidente da república.

Nas escolas, na década anterior, os filhos da “revolução” cresciam tendo aulas de “moral e cívica”, que reverenciavam “nossos” presidentes. O movimento estudantil não tinha mais força, as manifestações culturais eram censuradas, a televisão deixava-nos burros, muito burros demais. Todo esse cerceamento de liberdade teve conseqüências na formação intelectual dessa geração perdida, que parecia de outro mundo, uns aliens alienados, que não tinham outra cara pra mostrar. Eram o fruto de todo esse lixo, “toda essa droga que já vem malhada antes de eu nascer”. Não havia outra saída: “vamos cuspir de volta o lixo em cima de vocês”.

Na década de 80, enfim, o sinal fechado do período de repressão tornou a abrir. Em 1979, veio a Lei da Anistia e em 1982, eleições diretas para governador, embora ainda não para presidente (Diretas já já). “Eu vejo a vida melhor no futuro”. Porém, o que fazer com essa senhora liberdade, que abria suas asas sobre nós? Que caminho seguir? Não sabíamos lidar com isso.

Por outro lado, se a política caminhava em direção a uma maior abertura, a liberdade sexual trilhava o caminho inverso: “meu prazer agora é risco de vida”. Frutos da revolução sexual dos anos 60, os jovens de então depararam-se com um vírus desconhecido, o qual, por ter sido, a princípio, entendido de maneira equivocada como exclusividade de homossexuais e africanos, alastrou-se rapidamente, resultado da filosofia egoísta dos “sem-risco”: “se não seremos atingidos, por que nos preocuparmos?”. Hoje, paga-se o preço por esse descaso.

Alienados, desiludidos, sem posições políticas definidas, “cansados de correr na direção contrária”, a seu jeito, os jovens protestavam: “indecente é você ter que ficar despido de cultura”, “as ilusões estão todas perdidas”, “os meus sonhos foram todos vendidos tão barato que eu nem acredito”, “meu partido é um coração partido”, “minha metralhadora cheia de mágoas”, “meu cartão de crédito é uma navalha”, “ideologia, eu quero uma pra viver”, “a gente não sabemos escolher presidente”, “ninguém respeita a Constituição, mas todos acreditam no futuro da nação”. Que país é esse?

Outros, em crise de identidade, apenas experimentavam o inédito prazer de comprar um disco e gostar de uma banda da qual seus pais não gostavam, que tivesse suas caras. Como rebeldes sem causa (“como é que eu vou crescer, sem ter com quem me rebelar?”), querendo negar os preceitos de Belchior de que “nossos ídolos ainda são os mesmos” e que “ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais”. Como eles, queríamos nos sentir capazes de produzir algo de valor e não mais ter que repetir: “a gente somos inútil”.

Até que não nos saímos tão mal e, em meio ao lixo que cuspimos, pudemos garimpar e encontrar belas poesias expelidas por Cazuza, Renato Russo e Júlio Barroso, que poderiam ter feito muito mais, não fosse o destino tão cruel ao dizimar algumas das principais cabeças dessa geração. Herbert Vianna escapou por pouco e outros talentos também sobreviveram: Arnaldo Antunes, Nando Reis e Paulinho Moska, que à época rondava o lixo com música barata, junto com os Inimigos do Rei, entre outros.

O alívio definitivo e a certeza de que a década não fora perdida veio, então, quando escutamos Gal Costa, Caetano Veloso, Ney Matogrosso e Luiz Melodia cantando Cazuza, Chico Buarque cantando com Paula Toller, Tom Jobim com Marina Lima e Gilberto Gil cantando e compondo com os Paralamas do Sucesso, assim como exaltando o que acontecia, em seu “Roque santeiro – o rock”. O paradoxo estendido nas areias escaldantes, então, desfez-se, junto com um mar de dúvidas. Descobrimos, enfim, que poderíamos gostar desses expoentes da nossa geração sem romper com nossos grandes e insubstituíveis ídolos, os mesmos de nossos pais. Roqueiro brasileiro deixou de ter cara de bandido.

Fonte: Overmundo

O Overmundo é um site colaborativo. Um coletivo virtual. Seu objetivo é servir de canal de expressão para a produção cultural do Brasil e de comunidades de brasileiros espalhadas pelo mundo afora tornar-se visível em toda sua diversidade. O Overmundo adota como política geral de publicação uma licença Creative Commons.

20 comentários:

Daniel Barbosa disse...

Paulo, que velhos bons anos 80 que não voltam mais, mas que estão sempre presentes no nosso imaginário...

O rock nacional dos anos 80 foi uma verdadeira árvore florescente, deu à música brasileira preciosos frutos, como Cazuza, Renato Russo, Leoni e tantos outros.

Parabéns pelo blog!

Aguardo uma visita sua no meu tbm!

http;//expressaompb.blogspot.com

Quem sabe a gente não pode firmar uma parceria e adicionar os nossos blogs em nossas páginas, hein?

Abraços,

Daniel

Yerko Herrera disse...

Daniel!!! Este texto é uma excelente síntese do período musical do rock brasileiro dos anos 80, onde surgiram diversos poetas. Porém, o Paulo Bap não escreve para este blogue. O texto em questão é uma reprodução do que ele escreveu para o Overmundo (www.overmundo.com.br).

Pra entrar em contato com o cara entra neste endereço: http://www.overmundo.com.br/perfis/paulo-bap

Abraços,
Yerko Herrera.

Daniel Barbosa disse...

Vou acessar o Overmundo, pelo texto do Paulo, o site deve ser bom!

Ah! agradeço a sua visita e o comentário! Sua página é muito interessante. Vou adicioná-la no meu blog (link "Blogs que valem a pena"). Se puder adicionar o meu também, lhe serei grato!

Abraços!

Daniel

Anônimo disse...

* .. *..(¨`•.•´¨). *`•.¸.•´* . * . * . *Estou aqui por 5 motivos
..* ... *`•.¸.•´ * *. * . * . * ... * . *
* . * . * . . * . *.*.*.*.*.*.*.*.*.*.*.*

1º: Pra te dar um Oiiiiiii Bem caprichado !!
2º: Pra te deixar um GRandeeeeeeeeeeee beijo !!
3º: Pra saber como tu estás ??...
4°: Pra não te esqueceres de mim!!
5: Para saber como passaste o teu aniversario:)
5°: E e claro pra te desejar um óptimo OPTIMO INIÇIO DE SEMANA!!

.•´¸.•*´¨) ¸.•*¨)
**Paixoes e Encantos*
(¸.•´ (¸.•` ¤
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_____( @ @ )_____
__ooO__(_)__Ooo__ Beijinho doce com muito carinho
Bom dia e bom iniçio de semana

Carla Granja

Anônimo disse...

Em termos de rock os anos 80 arrasaram!!! Cazuza,Legião,Capital,Paralamas,KidAbelha...
Em outros assuntos também a década de 80 arrasou.
Gostei do seu blog !!!

Yerko Herrera disse...

Valeu, Lac! Realmente, os anos 80, no contexto musical, foi muito frutífero.

Obrigado pela visita, fico feliz que tu tenha gostado do Música&Poesia! Volta sempre e participa quando quiser!

Abração,
Yerko Herrera.

Anônimo disse...

Eu como estou na casa dos 30 acompanhei na minha adolescência o rock nacional de Blitz em diante... até antes talvez com Raul e Zé Ramalho (talvez nem tão rock assim)...

Mas senti falta de grandes nomes dessa época e o grupo que fez os dois melhores shows que eu vi: IRA!

Também uma grande ausência de Engenheiros.

Yerko Herrera disse...

É verdade, alguns nomes importantes dos anos 80 estão ausente neste belo texto de Paulo Bap. Entretanto, acredito que ele quis traçar um breve panorama do rock daquele tempo, não era sua intenção um texto definitivo sobre o assunto.

De qualquer forma, boa observação. E realmente, um dos melhores shows que também assisti foi do Ira!. O Nasi tem uma baita presença de palco, fora as músicas do grupo, um rock simples mas eficiente!

Anônimo disse...

cade o Raul Seixas???????????

Yerko Herrera disse...

Toca Raul!!!

Camarada anônimo, Raulzito sempre faz falta, porém, acredito que a intenção deste texto era pra falar da geração rock Brasil surgida nos anos 80 e não das décadas anteriores.

Abração, participe!

Anônimo disse...

estou formatando um trabalho sobre o rock nos anos oitenta gostaria de uma ajuda e tenho uma comunidade no meu orkut chamada Rock na veia o endereço vai na url .

Yerko Herrera disse...

Grande Romeu! Bacana saber que tu está elaborando esse trabalho. É um trabalho acadêmico? Cara, no que eu puder te ajudar, estamos aí. No entanto aviso que não sou especialista no assunto. Quem sabe tu não fala com o autor deste texto, o Paulo Bap (http://www.overmundo.com.br/perfis/paulo-bap). Ele escreveu este artigo para o excelente saite Overmundo (www.overmundo.com.br).

Mas como disse, conta comigo!

Abração e obrigado pela visita.

Yerko Herrera.

www.outrocine.blogspot.com

Anônimo disse...

Gostei muito de ler isso tudo aí. Mas sinto falta de menção aos Picassos Falsos e a Plebe Rude - bandas não famosas, mas importantes para mim. Ah, não podemos esquecer o blues do Andre Cristovam e o Celso Blues Boy.

Valeu.

Marcelo Hagah
João Pessoa-PB

Anônimo disse...

Adorei o texto...
você foi preciso e objetivo,
parabéns!
Amanda B.

Anônimo disse...

Genial post and this mail helped me alot in my college assignement. Thank you seeking your information.

oitentista zero disse...

a onda new wave e rock nacional eram
a coisa mais bela do rock que se foi
constuido no brasil queiria tem meus
15 anos nos anos 80 como nasci em 82
peguei o barco andando dessa decada
as pessoas eram mais felizes a musica
era inspiradora a atmosfera da decada
era perfeita pois tinhamos sonhos e
pelo que lutar a unica injustiça das
fms foram nao consagrar o grupo zero
a melhor banda dessa decada como rock
popular nao foram divulgados como mereçiam pois a poesia de guilherme isnard era do fundo da alma verdadeiros poetas boemios
estavam nessa decada hoje vivo em
um mundo estranho e mal que as
pessoas vivem isoladas em seu mundinho mesquinho e feio viva os
anos 80 onde vc valia o que era
não o que tinha

lucas disse...

alguem sabe de alguns livros sobre o tema preciso fazer um trabalho e estou com dificuldade de encontrar livros do assunto.
obrigado

Yerko Herrera disse...

Lucas, num artigo da Wikipédia que trata sobre o tema "Rock Brasil" são citados como fonte os seguintes livros:

Bibliografia

Alexandre, Ricardo. Dias de Luta: o Rock e o Brasil dos Anos 80. Editora: DBA (2002)

Dapieve, Arthur. Brock: o Rock Brasileiro dos Anos 80. Editora 34 (1995)

Motta, Nelson. Noites Tropicais – Solos, improvisos e memórias musicais. Editora Objetiva, 2000 ISBN 8573022922

Alves Junior, Carlos Alves e MAIA, Roberto: Rock Brasil - Um Giro Pelos Últimos 20 Anos do Rock Verde e Amarelo - O Livro - Vol. 2. Editora: Esfera (2003). ISBN 85-87293-30-3

Daniel Barbosa disse...

Lucas, leia "Dias de Luta", do Ricardo Alexandre.É ótimo!

Anônimo disse...

nem vivi naquela época e sinto saudades.as letras de musicas tinham sentido,eram poesias.hoje vejo que a musica brasileira perdeu um pouco de seu sentido.
mas,enfim adorei o blog!