Chico Buarque de Holanda recita Carlos Drummond
O lutador (clique e ouça)
Da coleção de quatro cds Poesia falada - Vol 15 - Reunião - 2002 O Brasil dizendo Drummond, organizada por Paulinho Lima.
Carlos Drummond de Andrade sobre Chico Buarque
O jeito, no momento, é ver a banda passar, cantando coisas de amor. Pois de amor andamos todos precisados, em dose tal que nos alegre, nos reumanize, nos corrija, nos dê paciência e esperança, força, capacidade de entender, perdoar, ir para a frente. Amor que seja navio, casa, coisa cintilante, que nos vacine contra o feio, o errado, o triste, o mau, o absurdo e o mais que estamos vivendo ou presenciando.
A ordem, meus manos e desconhecidos meus, é abrir a janela, abrir não, escancará-la, é subir ao terraço como fez o velho que era fraco mas subiu assim mesmo, é correr à rua no rastro da meninada, e ver e ouvir a banda que passa. Viva a música, viva o sopro de amor que a música e banda vem trazendo, Chico Buarque de Hollanda à frente, e que restaura em nós hipotecados palácios em ruínas, jardins pisoteados, cisternas secas, compensando-nos da confiança perdida nos homens e suas promessas, da perda dos sonhos que o desamor puiu e fixou, e que são agora como o paletó roído de traça, a pele escarificada de onde fugiu a beleza, o pó no ar, na falta de ar.
A felicidade geral com que foi recebida essa banda tão simples, tão brasileira e tão antiga na sua tradição lírica, que um rapaz de pouco mais de vinte anos botou na rua, alvoroçando novos e velhos, dá bem a idéia de como andávamos precisando de amor. Pois a banda não vem entoando marchas militares, dobrados de guerra. Não convida a matar o inimigo, ela não tem inimigos, nem a festejar com uma pirâmide de camélias e discursos as conquistas da violência. Esta banda é de amor, prefere rasgar corações, na receita do sábio maestro Anacleto Medeiros, fazendo penetrar neles o fogo que arde sem se ver, o contentamento descontente, a dor que desatina sem doer, abrindo a ferida que dói e não se sente, como explicou um velho e imortal especialista português nessas matérias cordiais.
Meu partido está tomado. Não da ARENA nem do MDB, sou desse partido congregacional e superior às classificações de emergência, que encontra na banda o remédio, a angra, o roteiro, a solução. Ele não obedece a cálculos da conveniência momentânea, não admite cassações nem acomodações para evitá-las, e principalmente não é um partido, mas o desejo, a vontade de compreender pelo amor, e de amar pela compreensão.
Se uma banda sozinha faz a cidade toda se enfeitar e provoca até o aparecimento da lua cheia no céu confuso e soturno, crivado de signos ameaçadores, é porque há uma beleza generosa e solidária na banda, há uma indicação clara para todos os que têm responsabilidade de mandar e os que são mandados, os que estão contando dinheiro e os que não o têm para contar e muito menos para gastar, os espertos e os zangados, os vingadores e os ressentidos, os ambiciosos e todos, mas todos os etcéteras que eu poderia alinhar aqui se dispusesse da página inteira. Coisas de amor são finezas que se oferecem a qualquer um que saiba cultivá-las, distribuí-las, começando por querer que elas floresçam. E não se limitam ao jardinzinho particular de afetos que cobre a área de nossa vida particular: abrange terreno infinito, nas relações humanas, no país como entidade social carente de amor, no universo-mundo onde a voz do Papa soa como uma trompa longínqua, chamando o velho fraco, a mocinha feia, o homem sério, o faroleiro... todos que viram a banda passar, e por uns minutos se sentiram melhores. E se o que era doce acabou, depois que a banda passou, que venha outra banda, Chico, e que nunca uma banda como essa deixe de musicalizar a alma da gente.
Carlos Drummond de Andrade
Publicado originalmente no, já extinto, diário Correio da Manhã, no dia 14 de outubro de 1966.
Fonte: Áudio e Artigo do saite oficial de Chico Buarque
O Lutador
Carlos Drummond de Andrade
Lutar com palavras é a luta mais vã.
Entanto lutamos mal rompe a manhã.
São muitas, eu pouco.
Algumas, tão fortes como o javali.
Não me julgo louco.
Se o fosse, teria poder de encantá-las.
Mas lúcido e frio, apareço e tento apanhar algumas
para meu sustento num dia de vida.
Deixam-se enlaçar, tontas à carícia e súbito fogem
e não há ameaça e nem há sevícia
que as traga de novo ao centro da praça.
Insisto, solerte.
Busco persuadi-las.
Ser-lhes-ei escravo de rara humildade.
Guardarei sigilo de nosso comércio.
Na voz, nenhum travo de zanga ou desgosto.
Sem me ouvir deslizam, perpassam levíssimas
e viram-me o rosto.
Lutar com palavras parece sem fruto.
Não têm carne e sangue
Entretanto, luto.
Palavra, palavra (digo exasperado),
se me desafias, aceito o combate.
Quisera possuir-te neste descampado,
sem roteiro de unha ou marca de dente nessa pele clara.
Preferes o amor de uma posse impura
e que venha o gozo da maior tortura.
Luto corpo a corpo, luto todo o tempo,
sem maior proveito que o da caça ao vento.
Não encontro vestes, não seguro formas,
é fluido inimigo que me dobra os músculos
e ri-se das normas da boa peleja.
Iludo-me às vezes, pressinto que a entrega se consumará.
Já vejo palavras em coro submisso,
esta me ofertando seu velho calor,
outra sua glória feita de mistério,
outra seu desdém, outra seu ciúme,
e um sapiente amor me ensina a fruir de cada palavra
essência captada, o sutil queixume.
Mas ai! é o instante de entreabrir os olhos:
entre beijo e boca, tudo se evapora.
O ciclo do dia ora se consuma e o inútil duelo jamais se resolve.
O teu rosto belo, ó palavra,
esplende na curva da noite que toda me envolve.
Tamanha paixão e nenhum pecúlio.
Cerradas as portas, a luta prossegue nas ruas do sono.
A banda
Chico Buarque/1966
Estava à toa na vida
O meu amor me chamou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
A minha gente sofrida
Despediu-se da dor
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
O homem sério que contava dinheiro parou
O faroleiro que contava vantagem parou
A namorada que contava as estrelas parou
Para ver, ouvir e dar passagem
A moça triste que vivia calada sorriu
A rosa triste que vivia fechada se abriu
E a meninada toda se assanhou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
O velho fraco se esqueceu do cansaço e pensou
Que ainda era moço pra sair no terraço e dançou
A moça feia debruçou na janela
Pensando que a banda tocava pra ela
A marcha alegre se espalhou na avenida e insistiu
A lua cheia que vivia escondida surgiu
Minha cidade toda se enfeitou
Pra ver a banda passar cantando coisas de amor
Mas para meu desencanto
O que era doce acabou
Tudo tomou seu lugar
Depois que a banda passou
E cada qual no seu canto
Em cada canto uma dor
Depois da banda passar
Cantando coisas de amor
domingo, 5 de agosto de 2007
Chico Declama Drummond, Drummond fala de Chico
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5 comentários:
OLÁ!AMIGO. TIVE A DAR UMA OLHADA NAS NOVIDADES E NOS VIDEOS E GOSTEI MUITO. EU TMB TENHO VIDEOS PORTUGUESES NO MEU BLOG, UM DE JOAO PEDRO PAIS K É UM EXCELENTE CANTOR E COMPOSITOR TMB E ONDE DIZ PARABENS MANO TMB TENHO UM VIDEO DA MINHA BANDA IRIS ELES SAO O MAXIMO. SE KISERES DÁ UMA OLHADA.
BJOS
CARLA GRANJA
Yerko... mais uma vez... sem palavras! Amo Chicooo!
E entòn, não consegui achar o tal link do meu fashioncast... rs!
Eu sou péssimo nesses sites... rs! Mas obrigado pela ajuda!
Carla!!! Já dei uma olhada nas novidades! Parabéns! Bem legais!!!
Beijo.
Pô Daniel, Chico é muito bom mesmo!!!
Cara, não desiste de colocar as músicas. No começo é meio complicado mesmo, mas depois tu vê que é fácil.
Existem outros saites que também fazem o mesmo que o eSnips, de repente tu te acerta melhor com outro. Por exemplo, se tuas músicas já existem na rede, tem o MyFlashFetish.com, que basta tu colocar o endereço de onde esta hospedado o mp3 pra criar teu tocador.
Valeu! Abração!
Sem palavras!
Chico é um espetáculo e você também! rs.
Muuuito bom gosto!
Beijos.
P.s: Quero mais Chicooooo!\o/
hehehehe.
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