quinta-feira, 31 de maio de 2007

Giberto Gil ampliou a compreensão das políticas culturais

Na era Gilberto Gil, as políticas culturais alcançam visão antropológica da Cultura

Acadêmicos aprovam políticas do ministro da Cultura e afirmam que o governo pela primeira vez abriu espaço para o conhecimento universitário na gestão do setor. Pesquisadores, reunidos no III Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura, temem, no entanto, pela não manutenção e não continuidade de políticas.

Carlos Gustavo Yoda*

Depois de anos da gestão do setor ser comandada apenas pela lógica neoliberal, a eleição de Lula e a nomeação do tropicalista Gilberto Gil para o Ministério da Cultura ampliaram a compreensão das políticas culturais no Brasil. Comunicólogos, historiadores, antropólogos, economistas, sociólogos, cientistas políticos e outros acadêmicos envolvidos com a Cultura estiveram reunidos entre os dias 23 e 25 de maio em Salvador (BA), para o III Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura (III Enecult) e aprovaram as políticas do ministro Gil.

O presidente da Fundação Biblioteca Nacional e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Muniz Sodré, afirma que qualquer política cultural tem que rever os conceitos básicos de cultura e compreender sua complexidade. “Entender sobre o que se fala é o primeiro passo. Repensar e resignificar tudo deve ser o segundo”, pontua.

Professor de Ciências da Informação e da Comunicação da Univesité Paris, Armand Mattelart lembra que foi em 1982, no México, quando pela primeira vez se reivindicou a noção antropológica de cultura. Anita Simis, da Universidade do Estado de São Paulo, afirma que o papel do Estado não é o de dizer o que é cultura ou como ela tem que ser. Mas o Estado tem a função de regular mecanismos para ajustar o desenvolvimento da cultura, garantindo a autonomia democrática. Política Cultural em um universo de diversidade cultural é isso. Diversidade representa também a questão de classe.

A pesquisadora paulista acredita que somente na gestão do ministro Gilberto Gil é que passamos a ter uma política cultural. “Além disso, a questão da diversidade foi assumida enquanto chave para a elaboração de uma política cultural diferenciada. Sem voltar para os preceitos do estado desenvolvimentista, o Estado voltou a ter um papel a cumprir, no desenvolvimento econômico, no setor cultural, na regulação de economias da cultura, de árbitro, de legislador”, entende Anita Simis.

O secretário da Cultura da Bahia, Márcio Meirelles, empossado no começo do ano (leia entrevista exclusiva com este repóter na Carta Maior), acredita que ousar é prerrogativa de quem governa: “Se não tivéssemos o Gil, ainda estaríamos falando que a cultura é um bom negócio”.

Albino Rubim, coordenador do Enecult diz, contudo, que é preciso radicalizar mais. “Tivemos três tradições na história da gestão de política cultural no Brasil: a da ausência, a do autoritarismo e a da estabilidade. O Gil parte para o enfrentamento, mas com uma série de limitações”, enfatiza. Rubim, como a maioria de seus colegas acadêmicos, considerou falha a atuação do Ministério na apresentação da Ancinav. Eles consideram que as necessárias mudanças na regulação do audiovisual podem atrasar dez anos com a ofensiva da mídia contra a regulação da comunicação.

Políticas Perenes
O professor Rubim, da Universidade Federal da Bahia, afirma ainda não ser possível realizar uma avaliação completa das ações do MinC: “Não é simples avaliar políticas culturais. É preciso trabalhar toda a complexidade e continuidade das ações”.

A historiadora Lia Calabre, da Fundação Casa de Rui Barbosa, diz ser difícil analisar os impactos de políticas culturais como causa e efeito. “O desafio é montar projetos que não se desmanchem com o advento de um novo governo. E a manutenção da política é tão mais intensa quanto for a sua relação com a sociedade”, diz a pesquisadora.

Calabre ainda espera uma visão inter-relacionada entre outros setores do governo e da universidade com a cultura. Mas considera que o Ministério conquistou espaço fundamental dentro do governo: “A gestão atual do Minc realizou avanços significativos no sentido de colocar a cultura dentro da agenda política do governo, fez com que ela deixasse de ter um papel praticamente decorativo entre as políticas governamentais. Porém, novas questões colocam-se. O grande desafio é transformar esse complexo de ações em políticas que possam ter alguma garantia de continuidade nas próximas décadas”.

Isaura Botelho, da Fundação Memorial da América Latina e do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, avalia que o Ministério da Cultura deu início a um intenso processo de discussão e reorganização do papel do Estado na área cultural. “Houve um grande investimento no sentido de recuperação de seu orçamento e a discussão de mecanismos que possibilitassem uma melhor distribuição de seus poucos recursos em relação ao equilíbrio regional voltou a ser uma preocupação”, considera.

Botelho afirma que esta é a primeira vez que o MinC abre espaço para o pensamento acadêmico na avaliação de políticas e dos números da cultura, em parceria com o IBGE. “Embora seja cedo para apostarmos no que ficará desta gestão, registro, pelo menos, a consistência do que vem sendo proposto e implementado. A aposta é consolidar a cultura como a base de expressão do próprio indivíduo e de conjuntos de indivíduos, como ferramenta mais decisiva para a construção e o exercício da cidadania”, conclui a pesquisadora.

* A reportagem do 100canais, parceiro da Carta Maior, acompanhou o III Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura, entres os dias 23 e 25 de maio, a convite da organização do evento.


Fonte: CartaMaior

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quarta-feira, 30 de maio de 2007

Crônica de Stanislaw Ponte Preta

Fábula dos Dois Leões
Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto)

Diz que eram dois leões que fugiram do Jardim Zoológico. Na hora da fuga cada um tomou um rumo, para despistar os perseguidores. Um dos leões foi para as matas da Tijuca e outro foi para o centro da cidade. Procuraram os leões de todo jeito mas ninguém encontrou. Tinham sumido, que nem o leite.

Vai daí, depois de uma semana, para surpresa geral, o leão que voltou foi justamente o que fugira para as matas da Tijuca. Voltou magro, faminto e alquebrado. Foi preciso pedir a um deputado do PTB que arranjasse vaga para ele no Jardim Zoológico outra vez, porque ninguém via vantagem em reintegrar um leão tão carcomido assim. E, como deputado do PTB arranja sempre colocação para quem não interessa colocar, o leão foi reconduzido à sua jaula.

Passaram-se oito meses e ninguém mais se lembrava do leão que fugira para o centro da cidade quando, lá um dia, o bruto foi recapturado. Voltou para o Jardim Zoológico gordo, sadio, vendendo saúde. Apresentava aquele ar próspero do Augusto Frederico Schmidt que, para certas coisas, também é leão.

Mal ficaram juntos de novo, o leão que fugira para as florestas da Tijuca disse pro coleguinha: — Puxa, rapaz, como é que você conseguiu ficar na cidade esse tempo todo e ainda voltar com essa saúde? Eu, que fugi para as matas da Tijuca, tive que pedir arreglo, porque quase não encontrava o que comer, como é então que você... vá, diz como foi.

O outro leão então explicou: — Eu meti os peitos e fui me esconder numa repartição pública. Cada dia eu comia um funcionário e ninguém dava por falta dele.

— E por que voltou pra cá? Tinham acabado os funcionários?

— Nada disso. O que não acaba no Brasil é funcionário público. É que eu cometi um erro gravíssimo. Comi o diretor, idem um chefe de seção, funcionários diversos, ninguém dava por falta. No dia em que eu comi o cara que servia o cafezinho... me apanharam.

Texto extraído do livro “Primo Altamirando e Elas”, Editora do Autor – Rio de Janeiro, 1961, pág. 153.

Conheça e vida e a obra de Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta) visitando "
Biografias".

Fonte: Releituras

Quem não reage, rasteja - O cinema de Cláudio Assis

Poesia em estado bruto
por Ana Paula Sousa


Protagonista Quem é Cláudio Assis, o mais atacado e bajulado cineasta do momento

Transgressor. Cláudio Assis (foto OGlobo)
À entrada do Espaço Unibanco de Cinema, em São Paulo, Cláudio Assis contempla, sozinho, o cartaz de Baixio das Bestas. Sobre o que matutava, é impossível dizer. Apesar de frases barulhentas e palavrões saltarem de sua boca feito pipoca das velhas panelas, não é simples decifrá-lo.

Assis, 46 anos, o mais atacado e bajulado cineasta brasileiro do momento, fala com tamanha verve que deixa o interlocutor atarantado. Quando não raivoso. Exatamente o mesmo efeito causado por Baixio das Bestas, em cartaz desde o dia 11, alvo de análises mil.

Dois dos melhores críticos de cinema do País, Inácio Araújo (da Folha de S.Paulo) e Luiz Zanin (do Estadão), se entusiasmaram nos respectivos blogs. “Nem sei o que dizer do filme (...). Este me parece o mais duro, mais cruel, mais conseqüente, mais infernal, mais belo dos filmes, brasileiros ou não, que entraram em cartaz ultimamente”, anotou Araújo. “Esse grande filme exige um espectador à sua altura, comovido e lúcido”, constatou Zanin.

Esta repórter viu o filme no Festival de Brasília, em novembro de 2006, e saiu da sala indignada. A sensação era de que Assis, mais do que denunciar a violência na Zona da Mata pernambucana, explorava visualmente a tragédia. As imagens pareciam perversão, cheiravam a misoginia. Difícil separar o que corria pela tela da personalidade agressiva que exibira durante uma entrevista, em 2002, sobre Amarelo Manga, seu primeiro longa-metragem. Ao mesmo tempo, era evidente a força que brotava da tela.

Houve gente que levou a ligação entre autor e obra a extremos. Na revista Piauí, um texto não assinado tachou o filme de “repulsivo, estúpido, abjeto”. O jornalista fantasma almoçou com o diretor e chocou-se: “Demonstrou os modos (estudadamente) mal-educados de um púbere mimado, pois almoçou sem tirar o boné e pontuou todas as frases com palavrões (...) Como era de se prever (em se tratando de um pernambucano macho paca) adorou o prato de carne crua”.

O preconceito embutido no texto realimentou, na internet, as discussões sobre o trabalho do cineasta. No cenário de mornidão da cultura brasileira, em que filmes vão e vêm sem que ninguém os note e autores sorriem para ficar bem na foto do jornal, Assis parece um agente desestabilizador. Pela postura e pela estética.

Ele já ameaçou bater num detrator do curta-metragem Texas Hotel (1999) e insultou Hector Babenco durante um prêmio porque o diretor de Carandiru falou mal de Lula. Foi também um dos que compraram a briga a favor da criação da Agência Nacional de Cinema e Audiovisual (Ancinav), atacada pelas pontas fortes da indústria de cinema e tevê.

Não por acaso, vive a dar entrevistas. “Teve uma época em que todo repórter, quando precisava de alguém para falar mal de coisas do cinema brasileiro, ligava pra mim. Acho que o chefe dizia: ‘Aquele Cláudio dá frase boa’. Agora até que passou”, diz, num raro momento em que deixa antever certo incômodo com o papel que lhe cabe. “Mas agora estou falando adoidado porque em filme de baixo orçamento você tem de aproveitar a mídia espontânea. Qualquer frase que saia, tá valendo.”

A julgar pelo que foi publicado e pelo conteúdo da primeira hora da conversa com CartaCapital, no café do Espaço Unibanco de Cinema, Assis repete frase quase como quem aperta a tecla play. “Não tenho rabo preso.” “Não faço concessão.” “O Brasil tem mania de rotular.” “Meu cinema é plugado no social.” Uma delas virou slogan: “Quem não reage, rasteja”. Ele também costuma usar a expressão “oxe” antes de uma negação.

“Oxe, eu não faço filme para ser polêmico. Ninguém é somente uma coisa. Você acha, sinceramente, que tem algo polêmico no que falo?”, pergunta, e em seguida responde. “Não tem. Só que muitos outros não falam. Mas jornalista me entrevista para falar da minha obra ou pra ver se eu uso boné? Ficar falando que eu como não sei de que jeito ou que eu bebo é reacionário, desnecessário.”

Como de discreto Assis não tem nada, freqüentadores do cinema esticavam os olhos sobre a mesa durante a entrevista. Alguns se manifestavam: “É isso aí, Cláudio! Muito bom”. Outro veio dizer que Baixio das Bestas era o único filme brasileiro de 2007 merecedor de atenção.

Apesar de perturbador, o filme é de uma plasticidade rara. Tem também cenas oníricas, como as do bloco de maracatu avançando como avançaria um vulcão. Há ainda a metáfora de um fosso sendo infinitamente cavado. Mas, e a sordidez? E o retrato de homens e mulheres tratados como seres perversos? E a violência sexual mostrada de forma bruta?

“Meu filme não é violento”, rebate. “Você pode dizer que é forte, contundente. Ele mostra coisas que a classe média não quer ver. Violento é o Bush, é o programa de tevê que bota a polícia matando adolescentes ao vivo. Eu estou mostrando uma realidade do sertão de Pernambuco. Não é chocante o que acontece no cultivo da cana? Mostrar isso é violento? Pena que as pessoas pensem assim. Aquele filme Irreversível é cult porque tem uns minutos de estupro. Aí tem os Tarantinos da vida. Eles são cult. Eu sou violento.”

Assis ataca o cinema nacional, lamenta que cineastas brasileiros sonhem com o Oscar (“Um quer filmar lá, outro quer concorrer a uma vaga pra concorrer a uma vaga para poder perder em Hollywood”) e diz que votou em Lula porque “tucano quer ser faisão”.

O cineasta gosta de contar que é pobre. A mãe era professora primária e o pai trabalhava numa usina de asfalto no Departamento de Estradas e Rodagem (DER). Mais velho de quatro irmãos, vendeu de tudo para ajudar em casa: biscuit, porta-toalha, porta-escova de dente, jogada milionária, carnê do Silvio Santos e livro. Foi também operário e cozinheiro de panelão no DER.

Do pai, herdou a mania por filmes. Passava a cartilha escolar para a filha do bilheteiro do Cine Caruaru e, em troca, entrava no cinema de graça. Aos 16 anos, com amigos do grupo de teatro da cidade, abriu um cineclube. “A gente botou tanta gente lá dentro que o dono do cinema mandou acabar com a sessão. Aí a gente teve de ir para um colégio.”

Assis rebobina rápido a vida. Dos 16, salta para os 20 anos, quando foi fazer faculdade (jamais concluída) e movimento estudantil no Recife. À época, correu periferias exibindo filmes como Braços Cruzados, Máquinas Paradas, de Leon Hirzman. “Teve um momento em que eu disse: não faço mais nada que não seja arte em movimento.” Vieram então os curtas-metragens feitos por paixão, os documentários televisivos e os vídeos institucionais feitos para o bolso. Tinha virado diretor.

“Sempre tive vontade de fazer arte. Quer dizer, nem sabia que era arte. Mas quando era pequeno, eu ficava na piscina e, quando passava um avião, pensava: quero ser como esse avião”, diz, deixando antever os sonhos que a rispidez cobre.

Depois de duas horas de conversa, é mais fácil adivinhar Assis e Baixio das Bestas. Ele repisa a certeza de que está contribuindo para uma tomada de consciência e declama versos da própria lavra (Homens velhos estão rindo/ Morrendo dia a dia/ Com seus sorrisos banguelos/ Que mais parecem agonia...).

Por que a agressão, a vida meio marginal? “Você tem de abrir portas. Ninguém dá oportunidade pra ninguém, meu bem. Eu já me senti invadindo uma festa. Nego olha pra mim, mas eu digo: ‘Eu vou na sua festa, vou tomar seu uísque’. Vivemos numa sociedade exclusivista. Você tá pensando que é fácil?”

Casado com Julia Moraes, neta de Vinicius de Moraes, Assis, que vive entre o Rio e Olinda, tem um filho de 3 anos e outro de 18. Diz que sonha com uma vida um pouco mais fácil para eles e deixa o olhar perder-se. “Se pensar muito, você fica melancólico. Você vai morrendo um pouco a cada dia que vê o quanto é difícil mostrar um filme. O jornalista também não pode ser o jornalista que ele quer. Aí todo mundo sofre. Que dignidade é essa que dizem que eu não tenho? Onde está essa dignidade que eu não sei? Na demagogia? No fim, é como diz o poeta: ‘Quem tem o mel, dá o mel. Quem tem o fel, dá o fel. Quem nada tem, nada dá’.”

Fonte: CartaCapital

terça-feira, 29 de maio de 2007

Ouça Drummond Recitando seus Poemas I

Escute Carlos Drummond de Andrade por ele mesmo

O Música&Poesia, a partir de hoje, irá postar diversas poesias de Drummond lidas pelo próprio. Este exemplar projeto de resgate faz parte do conteúdo do saite Memória Viva.

Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão.


Infância - Ouça

Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre mangueiras
lia a história de Robinson Crusoé,
comprida história que não acaba mais.

No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeu
a ninar nos longes da senzala – e nunca se esqueceu
chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha
café gostoso
café bom.

Minha mãe ficava sentada cosendo
olhando para mim:
- Psiu... Não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito.
E dava um suspiro... que fundo!

Lá longe meu pai campeava
no mato sem fim da fazenda.

E eu não sabia que minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé.


Quadrilha -
Ouça

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.


Confidência do Itabirano -
Ouça

Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes.

E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana.

De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil,
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa...

Tive ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!

Fonte: MemóriaViva

segunda-feira, 28 de maio de 2007

Paulo Autran Interpreta Fernando Pessoa e Luis Fernando Veríssimo

Ouça a leitura de Paulo Autran para a poesia Pecado Original, de Fernando Pessoa, e para a crônica Regininha ou os três dias do condor, de Luis Fernando Veríssimo.

De Fernando Pessoa, Pecado Original

De Luis Fernando Veríssimo, Regininha ou os três dias do condor

Paulo Autran interpretando textos da cultura lusófona pode ser acompanhado de segunda a sexta às 2h17, 9h57, 17h17 e 22h17, na BandNews FM.

A BandNews FM é transmitida em São Paulo (96,9), Rio de Janeiro (94,9), Porto Alegre (99,3), Belo Horizonte (89,5), Salvador (99,1) e Curitiba (96,3).

Fonte: BandNewsFM

Curta Nanquim

Curta a Viagem Surreal desta Produção


Nanquim é um filme experimental, realizado no Mato Grosso do Sul, que nos remete a uma experiência surreal. No curta, de Maurício Copetti, as tintas ganham formas não percebidas pela crueza do dia-a-dia. Nanquim por todos os lados: na escrita, desenho, pintura, tatuagem. Esta produção aguça nossa percepção sensorial. Imagem, som, forma, música, luz, pintura... O abstrato dando vida a um poema visual, onde o antigo e moderno se confundem.
Y.H.

Sinopse
Uma imersão onírica no mundo das formas.

NANQUIM


Gênero Ficção
Diretor Maurício Copetti
Elenco Bianca Machado, Buba Marques, Rubem Dario e Tatiana Santiago
Ano 2005
Duração 17 min
Cor P&B
Bitola Vídeo
País Brasil

Ficha Técnica
Produção Mauricio Copetti de Moura Fotografia Hélio Camerieri Roteiro Mauricio Copetti e Lucas Bicca Direção de Arte Dagô Pedroso Câmera Hélio Camerieri e Mauricio Copetti Edição Mauricio Copetti Edição de Som Leo Copetti Produção Executiva Mauricio Copetti

sexta-feira, 25 de maio de 2007

Você já ouviu falar de Silvia Machete?

Silvia, voz e molejo
por Fábio Rodrigues

Você já ouviu falar de Silvia Machete? Pois eu só ouvi recentemente. E fiquei surpreso. Primeiro, porque a moça é rodada. No bom sentido. Há doze anos morando fora do país, ela já mostrou seu trabalho musical/performático por dois anos em Nova York, além de ter se apresentado em países como França, Bélgica, Alemanha, Dinamarca, Espanha, Holanda, Itália, Israel, Austrália e Nova Zelândia. Depois, porque ela é dona de uma voz suave, agradável e cheia de molejo, molejo que se espalha pelo corpo.

A voz, que remete um pouco à de Marisa Monte, pode ser ouvida no belo CD que ela acaba de lançar, com o fabuloso título de “Bomb of love, música safada para corações românticos”. Nele, Silvia mistura composições próprias como a deliciosa “2 hot 2 b romantic” e releituras bem espertas de gente como Roberto e Erasmo Carlos (“Gente aberta”), Sergio Sampaio (“Foi ela”), e Guns & Roses (“Sweet child of mine”). O resultado, saboroso, mescla algo da chamada new bossa com um clima mais pop. Já o molejo, você descobre no fim da nota.

Agora, um pouco de história para situar: Silvia saiu do Brasil para estudar Civilização Francesa na Sorbonne. Largou a universidade, que já era outra, formada em artes circenses, uma troca bem interessante. E foi para as ruas mostrar o que aprendeu. Ganhou prêmios em festivais de artistas de rua na Holanda e na França, mudou para Nova York e subiu no palco. Críticas elogiosas no New York Times e na revista Time Out e recomendação do Village Voice depois, ela recolheu o time e veio para o Brasil preparar o disco.

Juntou-se com um time de feras formado por Nelson Jacobina (guitarra), Domenico Lancellotti (bateria), Stephane San Juan (percussão), Rodrigo Bartolo (baixo), Rubinho Jacobina (teclados) e Tiago Schardong (trompete) e preparou sua bomba de amor. Ou melhor, suas canções safadas para corações românticos.

Silvia estava prontinha para mostrar sua performance no palco. Mas um problema de saúde retardou a estréia um pouco. Já, já, ela está por aí. A propósito: antes que alguém estranhe o termo performance, ou ache que ele está aqui apenas como um modismo velho e bobo, vale a pena dar uma olhada no sítio de Silvia para ver o que ela faz no palco e ainda ouvir duas das músicas do CD.

Fonte:
TocaTudo

quinta-feira, 24 de maio de 2007

Animação com Ziriguidum



O Música&Poesia apresenta a animação em 3D Ziriguidum, de Gabriel Prezoto. O videoclipe faz uma crítica bem-humorada ao gravíssimo problema de violência que nosso país vive. A música tema Samba do Ziriguidum, na interpretação dos Novos Baianos, incentiva uma mulata de fartas carnes a sambar alegremente sem perceber o que acontece a sua volta.

Sinopse Ziriguidum é uma caricatura da situação Brasileira. Samba, miséria, violência e carnaval. Somos brasileiros, estamos no mesmo lugar, mas cada um têm uma visão.

Abaixo Ziriguidum em duas resoluções

Ziriguidum - maior resolução
Ziriguidum - menor resolução

Ficha Técnica
Gênero Animação
Roteiro, modelagem, luz, textura, animação Gabriel Prezoto
Arte Conceito Marcatti
Música Samba do Ziriguidum (Jadir de Castro/Luiz Bittencourt) - Novos Baianos
Duração 2'30''
Ano 2005
País Brasil

quarta-feira, 23 de maio de 2007

Segundo CD do Canastra encartado em revista

Outracoisa traz o novo disco do Canastra

A “Revista do Lobão” chega ao número 20 com fôlego de adolescente, boas pautas e o segundo disco da banda-sensação Canastra, Chega de falsas promessas (L&C Editora, 2007). No cardápio jornalístico da Outracoisa, uma boa conversa com Kid Vinil, os bastidores do prograna Alto-falante (Rede Minas), um perfil do guitarrista Pedro Sá, o disco Futurismo de Kassin + 2, uma matéria sobre músicos que estão se aventurando na literatura (Rogério Skylab e Bruno Medina, por exemplo), um debate sobre o destino do videoclipe, rock em salas de aula universitárias, o futuro do Mombojó, etc. e tal.

Já o disco que vem encartado nesta edição, Chega de falsas promessas, é uma excelente amostra de como o grupo liderado por Renato Martins (ex-Acabou La Tequila) conquistou o público e a imprensa do Rio de Janeiro, além des festivais de rock espalhados pelo país, com seus shows movimentados, letras bem humoradas e uma salada sonora que une rockabilly, jazz dos anos 1920, samba, música country e big bands gafieirísticas. Produzido pela dupla dinâmica Berna Ceppas e Kassin, o segundo disco do
Canastra traz músicas deliciosas como “Pomo-de-Adão”, “Motivo chacota”, “Dallas”, “Quando sim quer dizer não” e “Dois dedos de conhaque”, e participações de figuras como o lendário Lafayette e a cantora Nina Becker (Orquestra Imperial). Além de Renato, o Canastra é formado por Fernando Oliveira (guitarras, banjo e trompete), Marco Serragrande (trombone), Marcelo Magdaleno (saxes, gaita e percussão), Edu Villamaior (baixo acústicos e vocais) e Marcelo Callado (bateria e percussão), músicos vindos das bandas Big Trep e Carne de Segunda.

Detalhes irônicos: este disco é fruto da vitória do Canastra no Festival Oi Tem Peixe na Rede em 2005. O vencedor gravaria e lançaria um disco pela multinacional Sony BMG, mas após o resultado a conversa mudou de tom. Segundo relatos dos próprios integrantes do Canastra em matéria na revista, a gravadora já estava de olho nos paulistas do Luxúria, grupo que pegou o segundo lugar e lançou seu disco de estréia em 2006 pela Sony. No meio dessa bagunça, Lobão, o dono da revista que está lançando o Canastra, também assinou com a Sony e gravou o Acústico MTV.


Fonte: Gafieiras

Ouça abaixo algumas músicas do álbum de estréia do Canastra disponíveis no saite TramaVirtual

terça-feira, 22 de maio de 2007

Algumas do Mário Lago

Ai, que saudades da Amélia
(Ataulfo Alves e Mário Lago)

Nunca vi fazer tanta exigência
Nem fazer o que você me faz
Você não sabe o que é consciência
Nem vê que eu sou um pobre rapaz
Você só pensa em luxo e riqueza
Tudo o que você vê, você quer
Ai, meu Deus, que saudade da Amélia
Aquilo sim é que era mulher

Às vezes passava fome ao meu lado
E achava bonito não ter o que comer
Quando me via contrariado
Dizia: "Meu filho, o que se há de fazer!"
Amélia não tinha a menor vaidade
Amélia é que era mulher de verdade


Atire a primeira pedra
(Ataulfo Alves e Mário Lago)

Covarde sei que me podem chamar
Porque não calo no peito essa dor
Atire a primeira pedra, ai, ai, ai
Aquele que não sofreu por amor
Eu sei que vão censurar meu proceder
Eu sei, mulher
Que você mesma vai dizer
Que eu voltei pra me humilhar
É, mas não faz mal
Você pode até sorrir
Perdão foi feito pra gente pedir


Devolve
(Mário Lago)

Devolve toda a tranqüilidade
Toda a felicidade
Que eu te dei e que perdi
Devolve todos os sonhos loucos
Que eu construí aos poucos
E te ofereci
Devolve, eu peço, por favor
Aquele imenso amor
Que nos teus braços esqueci
Devolve, que eu te devolvo ainda
Esta saudade infinda
Que eu tenho de ti


Enquanto houver saudade
(Custódio Mesquita e Mário Lago)

Não posso acreditar
Que algumas vezes
Não lembres com vontade de chorar
Daqueles deliciosos quatro meses
Vividos sem sentir e sem pensar

Não posso acreditar
Que hoje não sintas
Saudade dessa história singular
Escrita com as mais suaves tintas
Que existem pra escrever o verbo ama

Enquanto houver saudade
Pensarás em mim
Pois a felicidade
Não se esquece assim
O amor passa mas deixa
Sempre a recordação
De um beijo ou de uma queixa
No coração


Fracasso
(Mário Lago)

Relembro sem saudade o nosso amor
O nosso último beijo e último abraço
Porque só me ficou da história desse amor
A história dolorosa de um fracasso
Fracasso, por te querer assim como quis
Fracasso, por não saber fazer-te feliz
Fracasso, por te amar como a nenhuma outra amei
Chorar o que já chorei, fracasso eu sei
Fracasso, por compreender que devo esquecer
Fracasso, porque já sei que não esquecerei
Fracasso, fracasso, fracasso, fracasso afinal
Por querer tanto bem e me fazer tanto mal


Leva o meu coração que ele é teu
(Mário Lago e Roberto Martins)

Leva meu coração que ele é teu
Leva que está pesando em meu peito
Pesa mais que a saudade
Do nosso amor que morreu
Pois não te vendo a meu lado
Meu coração não é meu
Mas tem cuidado, por Deus
Com meu coração
Não deixes o pobrezinho
Sem proteção
Talvez um dia eu te esqueça
Alguém me vire a cabeça
Pra amar de novo eu preciso do coração


Salve a preguiça meu pai
(Mário Lago)

Com meus pés, não vou
Venha me buscar
Mas só vou de colo
Pra não me cansar
O meu passo faz caminho
Mas se alguém não se agradou
Pra mudar vai dar trabalho
Com meus pés, não vou
Espinho não me amedronta
Nem pedra vai me assustar
Quem quer que eu saia da estrada
Venha me buscar
Com meus pés, não vou
Venha me buscar
Mas só vou de colo
Pra não me cansar
Oi, com meus pés não vou
Venha me buscar
Mas só vou de colo
Pra não me cansar
Com tristeza não me abalo
Com ameaça não me amolo
Pra brigar não tenho força
Mas só vou de colo
Quem quer, caminhe comigo
Vai ver que é bom de se andar
Quem não quiser me carregue
Pra eu não me cansar
(Salve a preguiça, meu pai
A preguiça é nossa
Já o português dizia que
O índio era preguiçoso
Porque não queria trabalhar pra ele
E se metia no meio do mato
Salve a preguiça, meu pai!)


Número um
(Mário Lago e Benedito Lacerda)

Passaste hoje ao meu lado
Vaidosa, de braço dado
Com outro que te encontrou
E eu relembrei comovido
O velho amor esquecido
Que o meu destino arruinou
Chegaste na minha vida
Cansada, desiludida
Triste, mendiga de amor
E eu, pobre, com sacrifício
Fiz um céu do teu suplício
Pus risos na tua dor
Mostrei-te um novo caminho
Onde com muito carinho
Levei-te numa ilusão
Tudo porém foi inútil
Eras no fundo uma fútil
E foste de mão em mão
Satisfaz tua vaidade
Muda de dono à vontade
Isso em mulher é comum
Não guardo frios rancores
Pois entre os teus mil amores
Eu sou o número um


Nada além
(Custódio Mesquita e Mário Lago)

Ouça aqui Nada Além (necessário Real Player)

Nada além
Nada além de uma ilusão
Chega bem
E é demais para o meu coração
Acreditando em tudo que o amor
Mentindo sempre diz
E vou vivendo assim feliz
Na ilusão de ser feliz
Se o amor
Só nos causa sofrimento e dor
É melhor
Bem melhor a ilusão do amor
Eu não quero e não peço
Para o meu coração
Nada além de uma linda ilusão


Fonte: MPBNet

Mário Lago, um Ilustre Brasileiro

ILUSTRES BRASILEIROS
MÁRIO LAGO

ARTISTA DAS CONVERSAS
Por Danilo Ribeiro Gallucci



Desde cedo entendeu que o significado da vida não estava nos livros de escola, mas nos relacionamentos humanos. Artista múltiplo, deixou marcas por onde passou. Foi escritor do Teatro de Revista, ator de cinema e tevê, companheiro de multidões em programas de rádio. Um dos mais ecléticos artistas brasileiros.

Foi em fins de novembro de 1911 que nasceu, no Rio, o único filho de Antônio e Francisca Lago. O parto difícil poderia, talvez, ter sido tomado como um prenúncio do que seria a vida de Mário: cheia de atribulações e percalços, mas sempre enfrentados com bom humor.
A meninice é recheada de manifestações culturais. Os avós eram músicos; o pai, maestro. Antônio Lago semeava a imaginação do filho com histórias fantásticas de cafés e cabarés. Na vizinhança, o ateliê de Cândido Portinari e a casa de Manuel Bandeira davam cores ilustres ao ambiente. As aulas de piano com Lucília Villa-Lobos acrescentavam um toque erudito à formação do rapaz. No entanto, ele se apaixonava mesmo era pelo samba.
Toda essa atmosfera desenvolve em Mário duas habilidades que lhe seriam muito frutíferas: conversar e escrever. Acreditava que conversando aprenderia mais do que na escola. Seus primeiros poemas são publicados aos 15 anos. Sua primeira música, anos depois: Menina, Eu Sei de uma Coisa, parceria com Custódio Mesquita.

O TRIVIAL DA VIDA

Nos anos 1930, ingressa na faculdade de Direito. Leva três anos para se formar; e, em três meses, abandona a advocacia. As constantes idas aos cafés o lançam num ambiente onde poucas coisas importavam mais do que discussões intelectuais e atividades culturais. Em fevereiro de 1933, estréia como escritor do Teatro de Revista, na Praça Tiradentes. O veredicto do público é fabuloso: Flores à Cunha provoca gargalhadas lacrimejantes. Com o sucesso, escolhe a atividade como ganha-pão. Anos depois, justifica: “Escrevo por prazer, mas trabalho por necessidade. Como meu trabalho é escrever, escrevo por necessidade”.
Para Mário, o Teatro de Revista mostrava às pessoas os dramas reais da vida, fazendo-as rirem de si mesmas: “Tudo na vida é risível, é só prestar atenção”. O sucesso o leva para a Rádio Pan-Americana, em São Paulo, aonde suas músicas já encantavam os bairros populares. Amélia badalava o carnaval, e composições como Dá-me Tuas Mãos e Nada Além eram difundidas pelo rádio, a maravilha das comunicações. No decorrer da vida, escreveria mais de 150 canções.
Em 1947, casa com Zeli Cordeiro, sua companheira por 50 anos. Usava as intermináveis noites em cafés e conversas acaloradas para extrair percepções poetizadas do cotidiano. Daí saíam seus livros, 11 no total. Obras como Manuscritos de um Empregadinho de Bordel e Rabo da Noite são, segundo ele, “colagens existenciais” que brincam com o trivial da vida.

QUARTÉIS E PARÁGRAFOS
Mário gostava de testar a censura, ver até onde podia ir. Em 1941 tem que prestar depoimento por criar a Associação Brasileira de Compositores e Autores. Ironiza: “Já pensou tomar o poder ao som de Pixinguinha, Nonô ao piano, Passos no trombone de vara, e na bateria o Almeidinha? Seria um forrobodó!”. É demitido da Rádio Nacional por discutir com o diretor, um coronel do Exército: “Ele entende de quartel, eu de parágrafos”. Para ele, a função social dos programas era educar, estimular a leitura. Por isso incutia em suas radionovelas pitadas de crítica social.

Com o golpe de 1964, tem a casa invadida pelos militares. Permanece sentado à máquina de escrever enquanto os cômodos são revirados. Um policial se aproxima, e, em tom de confissão, diz: “Nem vou contar à patroa que vim prender o senhor. Ela é fã de suas novelas. Se souber que o senhor não vai mais escrever, e que eu ajudei a lhe prender... Eu, hein...”

Em março de 1966, vai para a Rede Globo. Com a radicalização da ditadura, vira mais ator do que autor: “Não tenho mais coronária para agüentar conversa de censor”. Na nova fase, estréia ironicamente como um coronel nazista na novela Sheik de Agadir. Busca nos interrogatórios que prestou a caracterização do personagem.

Em 35 anos, faz mais de 40 novelas. No cinema, filmes como Terra em Transe e São Bernardo refletem sua preocupação em levar ao público temas relevantes para o País. Em 2001, recebe o título de Cidadão Benemérito do Estado do Rio de Janeiro por suas realizações artísticas. Chegou a dizer em entrevista: “Fiz um acordo com o tempo: nem ele me persegue e nem eu fujo dele. Um dia a gente se encontra”. Esse dia chegou em 31 de maio de 2002, quando Mário tinha 90 anos.

SAIBA MAIS
Mário Lago: boemia e política, de Mônica Velloso (Fundação Getúlio Vargas, 1998).


Fonte: AlmaqueBrasil


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segunda-feira, 21 de maio de 2007

Paulinho da Viola e Marisa Monte cantam Carinhoso

Carinhoso - Marisa Monte e Paulinho da Viola

Clássico de Pixinguinha e João de Barro na interpretação de Marisa Monte e Paulinho a Viola.

sábado, 19 de maio de 2007

Assista La M Manda

O Documentário que todos os dias fingimos não enxergar

Este microdocumentário mostra o triste mundo de desigualdades e contrastes da nossa realidade. O curta La M Manda, dos espanhóis Marisa Crespo e Moisés Romera, foi gravado na Índia, no entanto, poderia haver sido no Brasil ou em qualquer país da América Latina, Ásia ou África, onde a extrema desigualdade transforma a vida de milhares de pessoas numa verdadeira M...

O relato de La M Manda desfaz qualquer canção, mata qualquer poesia, mas, por incrível que pareça, não desfaz o sorriso de uma criança. Assista este filme e deixe de ver a vida pelo pára-brisas do automóvel ou pela vitrine da lanchonete.



*Assista aqui La M Manda


Sinopse
Uma anedota fugaz desvela uma verdade universal.

La M Manda
Gênero Documentário
Diretor Marisa Crespo / Moisés Romera
Câmera Moisés Romera
Roteiro Moisés Romera / Marisa Crespo
Música Julio Nebot
Duração 1'30''
Cor Colorido
Bitola Vídeo
Jaipur (Índia)


Baixe aqui para seu computador La M Manda

Caso houver problemas para assistir o filme no formato WMV, assista abaixo no player do Metacafe

La M Manda



*Para assistir, é preciso o Windows Media Player 9 ou 10. Clique aqui para baixar. Ou baixe o Media Player Classic que, além de ser programa de código aberto e livre, é muito menor que o outro e também serve como player de DVD, suporta legendas AVI, formatos QuickTime, RealVideo, entre outros.

Estudo revela visão de cineastas brasileiros sobre política

A política no cinema brasileiro
por Soraia Costa


Estudo feito pelo cientista político Carlos Luiz Strapazzon mostra visão dos cineastas sobre a política brasileira e os temas preferidos pelos artistas

Em estudo inédito, o professor de Ciência Política e Teoria Social Carlos Luiz Strapazzon, coordenador de pós-graduação, pesquisa e extensão das Faculdades Curitiba, listou 121 filmes nacionais que abordam questões políticas para saber como a política brasileira é vista pelos cineastas.

Os temas realistas e críticos foram os preferidos nas produções. A crítica ao regime autoritário e à violência do período ditatorial, por exemplo, foi tema de 27 filmes. As guerras nas quais o Brasil se envolveu, as rebeliões armadas regionais e os conflitos armados com motivos políticos estavam presentes em 20 filmes.

Além desses, também despontam na filmografia estudada as biografias, principalmente de presidentes e líderes de rebeliões e movimentos sociais e políticos, e filmes que convidam ao engajamento e fazem críticas à alienação.

As obras analisadas são resultado de 68 anos de produção cinematográfica e foram classificadas pelo pesquisador em dez grandes temas: regime autoritário de 1964; guerras, rebeliões ou conflitos armados locais; biográficos; ideologias, engajamento e alienação; violência urbana, injustiça social e ausência de Estado; trabalhadores na política; regime de Getúlio Vargas; “mandonismo” local; costumes e cultura política; e campanhas eleitorais. Várias das produções se encaixam em mais de um tema.

Para fazer a pesquisa, Strapazzon assistiu a 40% dos filmes listados e tomou depoimentos de alguns dos diretores. Também consultou críticos e sites especializados em cinema, reuniu a sinopse de todas as produções e buscou informações no Ministério da Cultura sobre os filmes realizados entre 1938 e 2006.

Engajamento x estética

Uma das explicações para o grande número de filmes realistas, e em especial de documentários, está relacionada à escassez de recursos para a produção. Mesmo assim, Strapazzon argumenta que há mais do que uma simples preocupação estética nessa escolha.

“Deu para perceber no testemunho dos diretores que efeitos especiais ficariam caros e é muito claro que a limitação de recursos levou à preferência pelo realismo e pelo documentário”, diz. “Mas tenho a impressão que essa opção pelo realismo tem mais a ver com a preocupação em fazer um cinema engajado do que com a estética simplesmente”, defende, lembrando que mesmo com poucos recursos, havia preferência por filmar guerras e conflitos, o que exigiria uma produção melhor caso a preocupação fosse com a estética.

O tema mais explorado na filmografia pesquisada é sem dúvida o da violência do período ditatorial. Ela aparece em suas diversas formas: contra a liberdade de expressão, as mulheres, os presos políticos, etc.

“Sobre alguns temas como autoritarismo é uma boa filmografia e analisa seus diversos aspectos. Agora, olhar para a filmografia é entender a violência institucional. Ela tem um alvo claro: a defesa da liberdade. É uma filmografia de denúncia mostrando o quanto o poder do Estado é opressor. A impressão que eu tenho é que eles não querem falar dos aspectos positivos para que não pareça que os fins justificam os meios, mas não duvido que daqui a alguns anos, com o distanciamento histórico, esses filmes sejam feitos”, avalia.

Outro aspecto ressaltado no estudo é o grande número de biografias. “Isso reflete uma sociedade que tem uma política pouco institucionalizada e que segue grandes líderes. Não há filmes sobre vilões e canalhas, por exemplo”, destaca o cientista político.

Mudanças históricas

Curiosamente, apesar de muitos filmes falarem sobre heróis, há poucas produções ufanistas. A maior parte dos filmes listados que ressaltam os aspectos positivos do país foi feita até o início dos anos 1950, antes ou durante a era Getúlio Vargas.

“Uma cinematografia alternativa, que tratava a política de uma maneira mais metafórica e sutil estava surgindo com o Cinema Novo, mas o regime autoritário interrompeu esse processo. A partir daí, o cinema passou a ser voltado para a crítica com o objetivo de formar opinião. Então a filmografia política começa ufanista, passou pela metáfora e depois caiu em um realismo denuncista”, explica Strapazzon.

Na avaliação dele, a tendência é que os filmes políticos passem por uma grande mudança e fiquem “mais poéticos e humanistas”, apesar de produções recentes como Zuzu Angel (2006) e O ano em que meus pais saíram de férias (2006) tratarem do recorrente tema da ditadura ainda em tom de crítica e denúncia.

“A gente está em uma época de grandes revisões e acho que é possível que isso aconteça com o cinema brasileiro. O tipo de argumento denuncista está caindo em desuso. Acho que pode ter uma releitura mais sutil e humanista dos últimos 40 anos do Brasil”, garante.

Essas produções “humanistas” destacariam as alegrias e tristezas, mostrando de maneira mais dramática as conseqüências das decisões e dos acontecimentos políticos. “Embora continue a ser crítico, o cinema não verá mais o Estado como vilão”, explica o professor.

Escassez

Outra questão que chamou a atenção de Carlos Luiz Strapazzon foi a escassez e mesmo a falta de temas considerados por ele essenciais como as relações entre o Estado e a Igreja, os partidos e as instituições políticas.

“Em um país católico como o nosso, podíamos ter uma história engajada sobre as relações do Estado e da Igreja e isso não precisaria tratar de aspectos negativos. Para esses temas serem atrativos só depende da criatividade do diretor”, diz. “Não fizeram um dos filmes do O Poderoso Chefão falando sobre esse tema? E ficou muito bom, diga-se de passagem”, ressalta.

Os aspectos positivos da política como a reabertura democrática, os sonhos da geração dos anos 80 e os líderes do movimento democrático também foram deixados de lado pelos cineastas.

“Não é, portanto, uma filmografia que projeta elementos positivos da política nacional, e quando o faz, aponta para um sentimento nacionalista exagerado, um tanto falso”, diz o professor em artigo que publicou sobre a pesquisa em seu blog.

Agora, o cientista político quer dar continuidade à sua pesquisa, terminar de assistir aos filmes já listados, procurar novos títulos e fazer entrevistas com alguns dos diretores e atores que participam dos filmes da lista.

“Quero ouvi-los para tentar validar as análises preliminares”, disse.

Veja a lista completa por tema e a sinopse por ordem cronológica de produção dos filmes.


Fonte: CongressoEmFoco

Matéria indicada por Wagner Machado

sexta-feira, 18 de maio de 2007

Livro Virtual de Sylvio Back Completo para Leitura

Livros em Bits

Existe um projeto muito bacana do site de literatura e arte Cronópios que se propõe a lançar livros virtuais, é o Cronópios Pocket Books. Os livros em bits concretizam de fato a proposta de serem virtuais. Para lê-los o internauta deve folha-los igual faria com uma obra real, no entanto, ao invés dos dedos usa-se o cursor.

O Música&Poesia apresenta o pocket book Kinopoems, de Sylvio Back. Cineasta, poeta e escritor Back é filho de imigrantes e nasceu em Santa Catarina. Autor de 36 filmes, entre eles dez longas-metragens, Sylvio Back tem 20 livros editados, entre poesias, ensaios e os roteiros de vários de seus filmes.

Leia aqui o livro virtual Kinopoems

Abaixo a apresentação que os editores do Projeto editorial Cronópios Pocket Books fazem do livro Kinopoems de Sylvio Back:

O cinema vai ao poema, "kinopoems". Ou como o autor profetiza no seu primeiro livro, "Moedas de Luz", "... o poema antevê o cinema". Agora, os versos se movem (movie) no éter e numa tela (screen) auto-invertida.

Neste delicado feixe de poemas-roteiro, que Cronópios Pocket Book tem a honra e o privilégio de dar passagem, Sylvio Back inaugura-se na virtualidade como se um móbile holográfico fora. Prestidigitação de câmara e fonemas em forma de páginas rigorosamente inconsúteis.

Daí a emergir uma invisibilidade luminosa ecoando vida, obra e morte de três poetas tão magníficos quanto imortais. Daí para os nossos efêmeros leitores, basta um piscar de olhos para que Bakun, Cruz e Souza e Leminski renasçam de imediato, holísticos.

Os editores

O Cheiro do Ralo - Abundante em Conteúdo

Respire o Cheiro do Ralo
por Yerko Herrera

Em cartaz em várias cidades do país, o longa-metragem O Cheiro do Ralo é um dos melhores filmes brasileiros produzidos nos últimos anos. Realizado com baixo orçamento é daqueles filmes que dependem da propaganda boca-a-boca, pois não possuem cotas abundantes (esta palavra de maneira nenhuma é referência a atriz Paula Braun!) de publicidade garantidos aos enlatados da Globo Filmes, que, além disso, dispõem de toda a máquina da emissora carioca para divulgação de suas novelas projetadas em tela grande. O Cheiro do Ralo, de Heitor Dhalia, subverte o politicamente correto que domina o cinema nacional e traz a frente um protagonista sem escrúpulos que em nenhum momento tenta se redimir de seus constantes erros. Carregado com humor cáustico, o filme de Dhalia consegue extrair de Selton Mello a melhor interpretação de sua carreira e já lhe rendeu alguns prêmios de melhor ator por este trabalho. Selton vive Lourenço, um mau-caráter que se sente feliz por comprar tudo o que pode, inclusive a infelicidade alheia, e por controlar tudo e todos à sua volta. Em seus momentos de reflexão consegue encontrar explicações para não culpar-se por seus erros de conduta. Nos raros instantes em que surgem sinais de arrependimento ele suborna sua própria consciência para preencher seus lapsos de indulgência. Seus únicos sinais de humanidade são demonstrados à pedaços do corpo: um olho de vidro, uma perna mecânica e uma magnífica bunda. Ah, e que bunda!

Vá ao cinema e prestigie o que de melhor se anda fazendo na produção cinematográfica brasileira. Para saber mais informações sobre o filme e as salas de cinema que estão exibindo O Cheiro do Ralo, visite o saite oficial: www.ocheirodoralo.com.br






quinta-feira, 17 de maio de 2007

Ca.Ge.Be faz rap usando bases da música brasileira

Ca.Ge.Be., um novo patamar para o rap nacional

por Dafne Sampaio

O rap nacional vem colecionando há pouco mais de 20 anos uma série de artistas que elevaram (e ainda elevam) os níveis de qualidade, identidade e popularidade do gênero. Enfim, gente que joga a rima pra frente. A lista é grande, diversa e segue aumentando com uma freqüência cada vez maior: estão em São Paulo, como os Racionais, Thaíde, Rappin Hood, Mzuri Sana, DJ Hum, Z’África Brasil, Mamelo Sound System, Dexter, Negra Li, Helião, Projeto Manada e Elo da Corrente; estão no Rio de Janeiro, como Marcelo D2, BNegão, MV Bill, Gabriel o Pensador, De Leve, A Filial e Black Alien. O rap também começa a sair do eixo como é o caso dos pernambucanos do Inquilinus. Mas o caso aqui é de mais um grupo de artesões das rimas e batidas, os paulistanos do Ca.Ge.Be., que estréiam em CD com o excelente Lado beco (Equilíbrio Discos, 2007). É a turma pegando corpo.

A história, como sempre, é bem anterior. O Ca.Ge.Be. (abreviação de “Cada Gênio do Beco”) foi criado em 1999 e tem como integrantes César Sotaque, Shirley Casa Verde, Branco da 12, André 29 e DJ Paulinho. Todos moradores da Zona Norte de São Paulo, a maioria do Jardim Peri. Já o disco começou a surgir quando César Sotaque conheceu em 2002 o DJ KL Jay (Racionais), dono do selo Equilíbrio Discos. A partir daí começou a produção, sob o comando do DJ QAP (SP Funk), das 18 faixas que levaram pouco mais de três anos para chegar a este disco. Ótima produção, diga-se de passagem.

A surpresa do Ca.Ge.Be. e de seu Lado beco vem tanto das excelentes letras em fluxo quebrado que falam sobre as dores e alegrias da periferia quanto das bases com samplers de artistas nacionais como Tim Maia, Paulo Diniz, Chico Buarque, Paulinho da Viola, Gerson King Combo, Raul Seixas, Aguinaldo Timóteo, Altemar Dutra e Barros de Alencar, entre outros. O discurso do grupo é forte, como tem que ser, mas as melodias trazem violões, pianos, violinos e outras pegadas acústicas que acrescentam sutilezas ao trabalho e uma vontade de construir uma identidade brasileira para o rap. Outro fato impressionante do disco é a regularidade, pois metade das 18 faixas está acima da média de qualquer gênero.

O repertório do disco investe em críticas sociais (“Combustível para viver”, “Lado beco”, “Barracão” e “Erros”) e intimidades (“A gente briga” e “Relacionamento”), sempre com um olho para fora e outro para dentro. Outros destaques do disco são “Ninguém vai te impedir” (um emocionante idílio sobre um fim de semana na periferia), a visceral “Curta vida”, a delicada “Menina” e a espetacular “Missão cumprida” com sua base repleta de violinos. Todos os quatro MCs dão conta do recado, vozes ótimas, mas César Sotaque e Shirley Casa Verde saem na frente com muita personalidade, e o disco traz ainda as participações de Nego William (ex-Vírus), Teto, Hélcio (Comando Criminal), Juarez, Vande (ex-Voz da Zona Norte) e DJ Cabeça (Estilo da Crítica), além do mestre KL Jay nos scratches.

p.s.: Para comprar o disco basta dar um pulinho no bom e velho MUBI.
Fonte: Gafieiras
Ouça algumas músicas do Ca.Ge.Be. no MySpace.
Ouça e baixe o mp3 da música Lado Beco

Soneto de Camões pra ouvir

Ouça soneto do poeta Luís de Camões interpretado por Luís Gaspar, locutor de publicidade português.



Erros meus, má fortuna, amor ardente
Em minha perdição se conjuraram;
Os erros e a fortuna sobejaram,
Que para mim bastava amor somente.

Tudo passei; mas tenho tão presente
A grande dor das cousas que passaram.
Que as magoadas iras me ensinaram
A não querer já nunca ser contente.

Errei todo o discurso de meus anos:
Dei causa (a) que a Fortuna castigasse
As minhas mal fundadas esperanças.

De amor não vi senão breves enganos.
Oh, quem tanto pudesse que fartasse
Este meu duro génio de vinganças!

Fonte: Palavras d'Ouro

quarta-feira, 16 de maio de 2007

Ronnie Von em reportagem da CartaCapital

Leia abaixo a reportagem sobre Ronnie Von que está na revista CartaCapital desta semana (16 de Maio de 2007 - Ano XIII - Número 444). Aproveite e baixe os dois volumes de Tudo de Novo - Tributo ao Ronnie Von que o Música&Poesia disponibiliza, desde o dia três de maio, aqui no blog. Esta edição de Carta Capital pode ser adquirida nas bancas.


Pobre menino rico
por Pedro Alexandre Sanches

Os jovens descobrem os rocks de Ronnie Von, enquanto ele se distrai com um programa de variedades na tevê aberta

A Jovem Guarda foi um movimento musical ultracomercial desenvolvido nos anos 60 por jovens pobres, suburbanos ou interioranos, culturalmente desinformados e politicamente alienados, certo? Mais ou menos. Perdido nas malhas do “reino” governado por Roberto Carlos, havia ao menos um rapaz oriundo de família rica, filho de diplomata, formado em economia, admirador de jazz, bossa nova e música erudita. Ronnie Von era o nome artístico dele.

Mais de 30 anos depois da estréia como cantor de iê-iê-iês dos Beatles traduzidos para o português, Ronaldo Lindenberg von Schilgem Cintra Nogueira toca em frente a carreira de publicitário (é dono de uma agência) e vive afastado da criação musical. De herança dos tempos da Jovem Guarda, quando cantava e apresentava programas televisivos movido pela pinta de galã, mantém contato direto com o público de segunda a sexta, na tela da Rede Gazeta.

O programa Todo Seu liquidifica um perfil popular com certas pitadas de sofisticação e sem as apelações habituais. Pesquisas mostram que cerca de 70% dos espectadores pertencem às classes A e B, assim como o apresentador, um fluminense de Niterói que mora em uma mansão no bairro paulistano do Morumbi.

O dado simultâneo de conflito e aproximação espontânea entre camadas sociais distantes é uma constante na história de Ronnie. Ele se lembra de quando a família descobriu, ouvindo no rádio o programa Disco Estrelinha, que o jovem herdeiro havia virado cantor.

“Minha tia-avó convocou uma reunião familiar, o tom era ‘onde foi que nós erramos?’, ‘criamos uma cobra para nos picar’, ‘esse menino vai colocar nosso nome na lama, nesse ambiente promíscuo’...”, lembra. “Outras famílias tinham os filhos envolvidos com bossa nova, e estava tudo bem. Comigo não teve acordo, saí dali arrasado. Vim para São Paulo, com a mão na frente, a outra atrás. Fiquei num hotelzinho discutível na praça Júlio Mesquita, com moças de vida difícil, rufiões, policiais.”

Convertido em sucesso instantâneo, conheceu o que hoje chama de “preconceito às avessas”. “Comecei a ouvir textos no rádio, ‘esse filhinho de papai está ocupando o lugar de alguém que precisa’. Eu tinha cara de quem acabou de sair do banho, era pior ainda. Diziam que eu era ‘o usurpador do trono do Rei’. Aconteceu essa segregação e essa realidade, eu nunca participei da Jovem Guarda.”

Tampouco os amigos de juventude e colegas de “música brasileira ortodoxa” o pouparam. “Meus pares da esquerda não aceitavam aquela ‘música de alienados’ feita com ‘instrumentos eletrônicos’. Minha amiga Elis Regina dizia: ‘Você ficou louco? O que está fazendo com esse bando de cabeludos?’ É um ambiente muito cruel, muito duro. Fui considerado menor a vida inteira. E foi preciso a molecada da garagem para redescobrirem o que fiz.”

Refere-se ao fato de que se afastou da música há dez anos, mas a música não parece querer se afastar dele. À revelia, um Ronnie Von surpreso testemunha o interesse crescente de jovens roqueiros de perfil independente e experimental pela obra inconseqüente que criou, sobretudo no intervalo entre 1968 e 1973.

O resultado mais recente do interesse é o Tributo ao Ronnie Von, que a jornalista Flávia Durante dirigiu de modo independente, com bandas recrutadas numa comunidade de devoção ao cantor no Orkut. Sem edição tradicional em CD por enquanto, o projeto está disponível na internet (www.ronnievon.blogspot.com), para download exclusivo e gratuito. O tributo virtual reúne 30 bandas em recriações dos rocks e baladas da chamada “fase psicodélica” de Ronnie. Já rendeu mais de 15 mil downloads. Ou seja, tem sido mais consumido que a grande maioria dos discos brasileiros em circulação no mercado tradicional.

“Procurei a discografia dele na internet e me apaixonei perdidamente”, conta Flávia. “Alguns dos participantes são realmente fãs, vários com histórias curiosas, como a Royale, de Piracicaba, cujo vocalista não se chama Ronaldo à toa: a mãe era fanática pelo Ronnie.”

Grande parte do culto atual ao artista se origina de Ronnie Von, gravado em 68 com o maestro erudito Damiano Cozzella e recém-relançado em CD pela gravadora Universal. Era um disco de humor não só psicodélico (nome que se dava à época ao rock feito supostamente sob o efeito de drogas alucinógenas), mas também tropicalista, sem que o autor tivesse muita consciência disso.

Malsucedida em termos de vendagens, a “fase psicodélica” espremeu-se entre duas outras, de apelo fortemente comercial. Entre 1966 e 1967, Ronnie firmara a imagem de “pequeno príncipe”, com sucessos como A Praça, de Carlos Imperial, também descobridor de Roberto Carlos. De 1977 em diante, virou ídolo romântico com baladas radiofônicas como Tranquei a Vida (1977) e Cachoeira (1984).

“Quem dizia o que eu tinha de cantar era o departamento de marketing da gravadora. Cantava o que mandavam, se o diretor dizia ‘vai por aqui’ eu ia. Até hoje, na tevê, é assim. Eu me deixo envolver, não tenho personalidade forte o suficiente para me insurgir, dizer ‘não, eu não quero’. Quanta bobagem eu fiz na vida. Errei muito mais que acertei”, auto-avalia.

Mas Ronnie Von também marcou alguns gols. Foi ele, por exemplo, quem impulsionou a primeira banda 100% original de rock brasileiro, os Mutantes de Rita Lee, Arnaldo Baptista e Sérgio Dias.

Assim ele se lembra do episódio: “Eu só tinha uma ligação mais forte com os Mutantes. Dei o nome ao grupo, levei para meu programa na Record, O Pequeno Mundo de Ronnie Von. Muitos anos depois, fiquei sabendo que fui contratado para ser anulado, para não concorrer com o Jovem Guarda (o programa de Roberto Carlos na Record). Não havia elenco, éramos só os Mutantes e eu. Tocávamos o lado A de Revolver (disco de 1966 dos Beatles), intervalo comercial, o lado B de Revolver, pronto”.

No mesmo embalo, foi criado o álbum Ronnie Von Nº 3 (1967), um dos primeiros balões-de-ensaio para o lançamento da Tropicália. “Foi o maior fracasso da minha vida, quebrou minhas duas pernas. Ninguém comprou, foi devolvido à gravadora”, avalia. Os arranjos eram do maestro Rogério Duprat. Os Mutantes e os Beat Boys, futuras bandas tropicalistas, o acompanhavam. Nenhum desses nomes constava dos créditos do disco, apenas o do então iniciante Caetano Veloso, como compositor e vocalista da faixa Pra Chatear.

“Não aparecia o nome de ninguém, não sei por quê. Perdi completamente o contato com Rita Lee. Convidei 36 vezes para ir ao meu programa, não sei se ela não gosta de mim”, lamenta. “Eu não sou chegada em programas de tevê. Dia desses a gente junta a creche e faz um piquenique”, Rita responde.

Algo parecido aconteceria em 1981, quando ele gravou Visagem, de Fagner e Fausto Nilo. “Tecnicamente, é a canção mais bem gravada da minha vida, com arranjo de Cesar Camargo Mariano. Não aparece o nome dele, a mesma história de novo.”

De modo geral, profissionais de renome pareciam se envergonhar de imprimir a assinatura lado a lado com a de Ronnie Von. Àquela altura, ele já andava imerso na onda dita “romântica”, ou “brega”.

Diz que se sentiu alijado e viveu situações de humilhação por conta da segmentação vigente. “Eu comungo dos mesmos ideais dos formadores de opinião, leio o que eles lêem. Mas acham que no ofício deixo a desejar. Quando é assim, você nem se olha no espelho. A pior luta do homem é a luta com ele próprio.”

A zona máxima de confusão entre tantos valores se deu nos impopulares discos confusos por excelência, que misturavam Tropicália, rock rural, canções de Tom Jobim, Ivan Lins e Zé Rodrix, utopia pan-americana, até um ponto de umbanda levado na guitarra (Cavaleiro de Aruanda, do argentino Tony Osanah, dos Beat Boys).

São essas as canções que seduzem o público roqueiro jovem de 2007. Aqui, os músicos de agora sublinham a empatia pela inconsciência do “pequeno príncipe”, como relata o entusiasta Leonardo Bonfim, um dos participantes do tributo virtual: “Eu pirei completamente no disco de 68. Acho um dos melhores discos psicodélicos de todos os tempos”. No Japão, o LP tropicalista chega a ser vendido por 1,8 mil dólares.

Aos 62 anos, o pobre menino rico do iê-iê-iê assiste à movimentação como um espectador incrédulo e algo distante. Talvez seja esse, desde sempre, um retrato fiel dele e da música pop que tentava fazer, ao comando dos departamentos de marketing, para o “povão”.


Revelação musical vinda do Acre

Los Porongas lançam luz sobre o rock muito longe das capitais
por Marco Antonio Barbosa

Responda rápido: qual foi a última vez em que você ouviu falar em uma revelação musical vinda... do Acre? Nunca ouviu? Tem certeza? "As pessoas costumam se lembrar do João Donato. Quando lembram, né?", disse ao Jornal Musical Diogo Soares, vocalista do grupo (acreano) Los Porongas, no backstage do festival Mada em 2006. A participação da banda no evento realizado em Natal foi o marco inaugural da exposição dos Porongas em nível nacional, uma escalada coroada com o recente lançamento de seu primeiro álbum, homônimo. Apontados de lá para cá como uma das grandes promessas do novíssimo pop nacional, os LP também sinalizam uma nova era no nosso rock. Depois das sucessivas surpresas reveladas em lugares como Brasília e Recife, nos anos 80 e 90 do século passado, centros urbanos ainda mais distantes do eixo Rio-São Paulo não páram de produzir artistas interessantes e vigorosos - que usam as peculiaridades de suas regiões de maneira inteligente, sem recair na macumba para turista.

Poronga, para quem não sabe, é um tipo de lamparina artesanal feita com latas de alumínio e abastecidas a querosene, usadas pelos seringueiros acreanos. "Tem gente que gosta de definir nosso grupo como 'rock amazônico', seja lá o que isso for. Rio Branco é cercada pela floresta e isso nos influencia, mas de uma forma menos óbvia; é mais na poética do que na sonoridade", explica João Eduardo, guitarrista dos Porongas, que completa a formação junto a Diogo, Márcio Magrão (baixo) e Jorge Anzol (bateria). "Somos obviamente centrados no rock, mas excercemos a diversidade que a Floresta Amazônica traz na hora das letras". E, de fato, em Los Porongas (Senhor F), o disco, não se ouvem tambores, gritos indígenas ou canto de pássaros exóticos. Um pop-rock que bebe na água do pós-punk oitentista, na versão abrasileirada (Legião Urbana) ou na fonte original (U2, Joy Division). Letras angustiadas ("Anseios temperados com receios/ Paranóias e outras dúvidas / Nada além de esconderijos") e vocais dramáticos espantam qualquer clichê de regionalismo. "Cada um traz suas influências. Eu, particularmente, gosto até de música caipira. Mas todos fechamos em torno de Beatles, Coldplay, Chico Science e Los Hermanos", afirma João Eduardo. Ao vivo, conforme o JM já pôde testemunhar em duas ocasiões, o som básico mas repleto de detalhes instrumentais é acrescido da performance marcante do vocalista Diogo.

Formada em 2003, a banda nunca se fez de rogada por estar na mais distante das capitais brasileiras (ao menos, em relação ao Sulmaravilha). Se não havia lugar para fazer rock em Rio Branco, eles fizeram o próprio espaço, criando no fim de 2004 o Guerrilha Rock Festival, com bandas do Acre e de Rondônia. "Do Guerrilha nasceu outro festival, o Beradeiros, em Porto Velho (RO), cuja primeira edição nós fechamos, em 2005", relembra o guitarrista. Também em 2005 eles organizaram a primeira edição do Festival Varadouro, que - ao convidar os grupos "gringos" Autoramas (RJ) e Vanguart (MT) - trouxe repercussão nacional à cena acreana. Ainda em 2005, lançam o primeiro EP, Enquanto uns dormem, pelo selo local Catraia Records. Isso tudo de lá mesmo, do Acre. "Mais do que a ponte entre o Norte e o 'centro' do Brasil, Los Porongas é a expressão da exuberância musical que, ciclicamente, irrompe das entranhas do país para dar sentido à música enquanto arte, e não apenas produto", afirmou Fernando Rosa, dono do selo Senhor F.

Quatro faixas do disquinho de estréia foram reaproveitadas no álbum, incluindo o mini-hit "Lego de palavra", sob a produção de Phillipe Seabra (vocalista da Plebe Rude e sócio do selo Senhor F). A amizade com o veterano surgiu justamente na edição 2006 do Mada. Segundo João Eduardo, a experiência de Seabra foi fundamental para o som encorpado do disco. "Ele já havia nos ouvido ao vivo e dado uns pequenos toques sobre algumas músicas. Isso empolga qualquer músico ávido por registrar aquilo em que está acostumado ao ouvir ao vivo". O primeiro álbum dos Porongas chega num momento em que a banda já está radicada em São Paulo, após se apresentar ano passado no Mada e no Bananada (GO) e no Festival Laboratório Pop (RJ). E para lançar luz sobre seu som, os Porongas não contam apenas com as lamparinas que inspiraram o nome da banda: usam a internet também. Antes mesmo que algum pirata se aposse do disco, a turma colocou o disco na íntegra para baixar em http://rapidshare.com/files/25207786/Los_Porongas.zip.htm.


Os Porongas não são os únicos nomes vindos de regiões improváveis a se destacar no cenário independente. Se excluírmos as capitais Rio e São Paulo e os pólos pop mais tradicionais como Porto Alegre, Goiânia e Recife, vamos verificar que há novidades saindo de Curitiba (Bonde do Rolê, Charme Chulo), Fortaleza (Montage), Cuiabá (Vanguart), Natal (DuSoutto), Belém (Coletivo Rádio Cipó)... Os festivais independentes já realizados este ano tiveram entre seus destaques bandas como a cearense Quarto das Cinzas (no Abril Pro Rock), a paraense Madame Saatan (que tocou no último Mada), o matogrossensse Macaco Bong (no Recbeat), e o paranaense - de Cascavel - Sebastião Estiva (no Ruído Festival, RJ). Coroando esse agito todo, o festival Grito Rock inverteu o processo e foi onde as bandas estavam. Em fevereiro, nada menos de 15 edições simultâneas do evento foram realizadas em locais tão fora de esquadro quanto Jaú e Mogi das Cruzes (SP), Vilhena (RO), Palmas (TO) e Macapá (AP).

Esse fenômeno foi notado pelo jornalista e agitador cultural Alex Antunes, curador do festival Supernovas, série musical do Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo. O evento juntou nomes da novíssima geração fora do eixo com medalhões do rock nacional, em parcerias inéditas. No encerramento, os cuiabanos do Vanguart vão tocar com João Ricardo, ex-Secos & Molhados, dia 15. "O que há de mais notável no cenário é que ótimas bandas estão surgindo de locais inusistados: Rio Branco, Cuiabá, Belém. Esse foi o conceito da série - não convidar ninguém do Rio ou de São Paulo", afirmou Antunes, que escalou o Montage, Ronei Jorge (Salvador), Madame Saatan e também os Porongas. O vídeo com a apresentação dos acreanos no Supernovas pode ser baixado em http://rapidshare.com/files/25661524/Los_Porongas_ao_Vivo_-_CCBB.zip.html.


segunda-feira, 14 de maio de 2007

Ouça por completo memorável álbum de Gal Costa

O Instituto Memória Musical Brasileira (IMMUB), que é uma Organização Não Governamental, sem fins lucrativos, sediada no Rio de Janeiro e voltada para a pesquisa, preservação e divulgação da Música Popular Brasileira, já faz um tempo anda organizando em seu site uma Discografia Básica da Música Brasileira. A cada semana coloca em exibição um disco diferente para que os internautas votem e opinem se ele merece fazer parte dessa seleção. Esta semana o álbum para votação é "FA-TAL GAL A TODO VAPOR", de Gal Costa.

Confira os últimos resultados:

"Elis & Tom" (Elis Regina e Tom Jobim), com 96% dos votos, entrou.
"Quem é Quem" (João Donato), com 60% dos votos, entrou.
"Vivo" (Alceu Valença), com 85,71% dos votos, entrou.
"Nelson Cavaquinho" (Nelson Cavaquinho), com 96,15% dos votos, entrou.
"Pérola Negra" (Luís Melodia ), com 98,04% dos votos, entrou.


Esta semana, em debate:
"FA-TAL GAL A TODO VAPOR"
Gal Costa
(1971) Philips 6349 020/1
Os lanceiros do tropicalismo, Caetano e Gil, ainda estavam exilados em Londres quando Gal Costa fez o show A todo vapor, no Teatro Tereza Rachel, em Copacabana, no Rio, em 1971. Era o auge do desbunde, Gal segurava o estandarte do movimento tropicalista coadjuvada por Waly Salomão (então sob a indentidade psicodélica de Sailormoon), Jards Macalé, Torquato Neto (em sua coluna do extinto jornal Última Hora). Waly dirigiu o show, cuja sigla emblema Fa-tal foi extraída de um poema de seu livro Me segura que eu vou dar um troço, enquanto A todo vapor saiu de sua parceria "Vapor barato", "fase morbeza romântica", com Macalé, incluída no roteiro do show que virou disco. A belíssima canção ressurgiria em 1995, na trilha do filme Terra estrangeira, de Walter Salles Jr., o Terra em transe da era Collor.
Waly ainda criou o conceito gráfico do projeto de palavras/fotos (de Edison Santos e do cineasta Ivan Cardoso) baseado no cinema de Dziga Vertov. Os artistas plásticos Luciano Figeiredo e Oscar Ramos embalaram este precursor álbum duplo gravado ao vivo sob audaciosos cortes e enquadramentos. Ao banquinho e violão, como discípula da bossa ("Coração vagabundo"), mas também cantando Jovem Guarda ("Sua estupidez") e revisitando um dos fundadores do samba, Ismael Silva ("Antonico"), Gal Costa reina no disco no ápice de sua fase de diva marginal. Com o apoio das guitarras do mítico Lanny Gordin (autor dos arranjos) e do novobaiano Pepeu Gomes, sua voz magnífica alterna as tensões acustico-elétrica num repertório sem desperdícios.
Da produção do Caetano exilado ("Como 2 e 2", "Maria Bethânia" e até o frevo carnavalesco "Chuva, suor e cerveja") aos atemporais Geraldo Pereira ("Falsa baiana") e Luiz Gonzaga ("Assum preto", com Humberto Teixeira), o visionário "Charles anjo 45", de Jorge (ainda) Ben, folclore ("Fruta gogóia", "Bota a mão nas cadeiras") e a produção então recém saída do forno de Morais Moreira (Dê um rolê", com Galvão), Macalé ("Hotel das estrelas", com Duda) e Waly ("Luz do sol", com Carlos Pinto) com outros parceiros ou reunidos ("Mal secreto").

Tárik de Souza

Disco: 1

1. Dê Um Rolê
(Moraes Moreira / Galvão)

2. Pérola Negra
(Luis Melodia)

3. Mal Secreto
(Waly Salomão / Jards Macalé)

4. Como 2 e 2
(Caetano Veloso)

5. Hotel das Estrelas
(Jards Macalé / Duda)

6. Assum Preto
(Luis Gonzaga / Humberto Teixeira)

7. Bota a Mão nas Cadeiras
(Tradicional)
Música tradicional baiana

8. Maria Bethânia
(Caetano Veloso)

9. Não Se Esqueça de Mim
(Caetano Veloso)

10. Luz do Sol
(Carlos Pinto / Waly Salomão)


Disco: 2

1. Fruta Gogóia
(Tradicional)
Música tradicional baiana

2. Charles Anjo 45
(Jorge Ben "Jorge Benjor")

3. Como 2 e 2
(Caetano Veloso)

4. Coração Vagabundo
(Caetano Veloso)

5. Falsa Baiana
(Geraldo Pereira)

6. Antonico
(Ismael Silva)

7. Sua Estupidez
(Roberto Carlos / Erasmo Carlos)

8. Fruta Gogóia
(Tradicional)
Música tradicional baiana

9. Vapor Barato
(Jards Macalé / Waly Salomão)

Felipe Tadeu (Jornalista):
Gal Costa cresceu como dedicada aprendiz das artes do feiticeiro zen João Gilberto, mas em Fa-Tal a verdadeira baiana se assumiu também como discípula de outro ícone musical que sacudiu a América, a do norte: a dilacerante Janis Joplin. A canção “Vapor barato”, tatuagem blue que Gal talhou em si mesma numa época em que cantar era deixar sangrar, despontava como um dos ápices do show que ela emplacara em 1972 no Teatro Tereza Rachel (sim, o mesmo templo onde se dariam outros dois espetáculos também mitológicos, o Vou Danado pra Catende, de Alceu Valença e o Volta pra Curtir, de Luiz Gonzaga). Num roteiro extenuante, que lincava o admirável Ismael Silva de “Antonico” à “Sua estupidez”, obra-prima de Roberto e Erasmo Carlos, passando por Jorge Ben e pelo até então inédito Luiz Melodia e sua “Pérola negra”, além de duas preciosas de Caetano, “Como 2 e 2” e “Coração vagabundo”, o Fa-Tal entrou para a história por ser o álbum mais inspirado de Gal Costa, senhora absoluta tanto dos temas plácidos, como dos rocks mais desencapados. Fa-Tal fez de Gal um mito sexual que escancarava os limites da sexualidade no lado de baixo do Equador. Tudo com a cumplicidade do diretor geral Waly Salomão, o cara que escreveu Me Segura que Eu Vou Dar um Troço. Discaço. (S)

Ricardo Schott (Revista Bizz):
Assim como Acabou chorare, dos Novos Baianos (disco com o qual guarda muitas semelhanças, entre as quais o link com João Gilberto), Fa-Tal é o disco que sinaliza que, apesar da ditadura, ser jovem e brasileiro nos anos 70 era bom. Apesar dos (ô clichezinho...) anos de chumbo, era legal estar vivo para ver toda uma movimentação cultural que se iniciava na praia (mais aproximadamente nas Dunas da Gal), para conhecer uma época em que os shows eram tão bons e baratos que os fâs saíam pedindo dinheiro nas ruas para assistir a todas as temporadas (e isso aconteceu igualmente com Gal e Novos Baianos, que dividiam temporadas no Teatro Teresa Rachel, em Copa), para ver uma esquerda brasileira renovada se aproximando (os “desbundados“, que, citando Ana Maria Bahiana, eram os que falavam "eu quero um mundo melhor, mas não do jeito da esquerda tradicional, que tem rigidez austera e devoção a Lênin"). Como souvenir, ainda tem o disco duplo, gravado precariamente, mas com caráter documental inestimável, flagrando a união entre a calma do violão gilbertiano (no primeiro bloco, com canções como "Fruta gogóia" e "Falsa baiana") e a estridência do rock (em "Hotel das estrelas", "Pérola negra" e na amargurada "Luz do sol"), assim como o Led Zeppelin amalgamava folk, blues elétrico e pré-metal. Como link definitivo, "Vapor barato", que, partindo da bossa, mostra o blues acústico virando hard rock. (S)

Marco Antonio Barbosa (Jornal Musical):
Gal Costa, no começo dos anos 70, era nossa Janis Joplin, nossa Aretha Franklin, nossa Tina Turner – figura feminina ímpar no cenário pop brasileiro, forte, contestadora, musical até dizer chega, mas acima de tudo NOSSA. Porque em sua fase de musa tropicalista, Gal não se limitava a emular os ícones importados; ela representava um paralelo bem brasileiro da bagunça que as citadas frontwomen promoviam lá fora. Um paralelo no qual Ismael Silva convivia pacificamente com guitarras distorcidas, e Roberto Carlos se irmanava a Ary Barroso. Fa-Tal não é apenas a melhor polaróide desse período, mas também a última. Logo depois de lançar o registro do antológico show homônimo (originalmente em vinil duplo), Gal redesenharia sua trajetória com o igualmente influente Índia – abrandando sua veia pop e lançando as bases para a intérprete mais contida dos anos posteriores. Não há, porém, contenção em Fa-Tal. Disco de extremos, seja de doçura ("A sua estupidez", "Coração vagabundo", "Antonico"), seja de selvageria ("Dê um rolê", "Hotel das estrelas"), este álbum vasculhava a memória afetiva da cantora e a conjugava com os acelerados e elétricos tempos que a música pop mundial vivia na época. Momento histórico para Gal e para nós. (S)

Tom Cardoso (Jornal Musical):
Era de se esperar que Gal, em plena ditadura militar, com metade dos Doces Bárbaros no exílio, fizesse um disco político, cheio de canções de protestos. Mas seu sangue era tropicalista. Sua revolução era outra: cantar Roberto Carlos, Macalé, Humberto Teixeira e Geraldo Pereira. Gal está soberana, mas o espírito libertário de Fa-Tal ela deve ao diretor geral do disco, Waly Samolão. Cantar coisas do tipo “Não se assuste pessoa se eu lhe disser que a vida é boa”, em pleno AI-5, é de matar qualquer ideologia. (S)
Vá até o site do IMMUB para votar no disco de Gal Costa
Fonte: IMMUB
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