sábado, 31 de março de 2007

Reprodução
Finalmente! Os Racionais MC’s chegam ao DVD

por Dafne Sampaio

Anunciado há mais de dois anos e vítima de sucessivos atrasos desde dezembro de 2006, o primeiro DVD dos Racionais MC’s, 1000 trutas 1000 tretas (Cosa Nostra/Unimar, 2007), finalmente foi lançado e todas as (altas) expectativas foram devidamente atendidas. Afinal de contas, além de um excelente registro ao vivo, o disco traz também uma série de documentários que vão desde bastidores do show até um longa sobre a presença e a cultura negra na cidade de São Paulo desde o século 19 até os dias de hoje. Vai vendo...

O show traz 15 faixas muito bem gravadas em 2002, no Galpão do Brás (Centro de São Paulo), e 2004, no Sesc Itaquera (Zona Leste de São Paulo), onde o quarteto formado por Mano Brown, Ice Blue, Eddy Rock e o DJ KLJay mostra todo seu carisma e vigor no palco em interpretações de raps retirados dos discos Sobrevivendo no inferno (1998) e Nada como um dia após o outro dia (2002). Surgem assim versões arrepiantes de “Vida loka (parte 2)”, “Tô ouvindo alguém me chamar”, “Negro drama”, “Diário de um detento”, “Fórmula mágica da paz” e “Da ponte pra cá”, além da participação especial de Jorge Ben em “A benção mamãe, a benção papai”. O público, majoritariamente masculino, sabe todas as letras quilométricas de cor, pois suas histórias estão ali, em cima do palco, sendo cantadas sem meias palavras e com todas as cores. Mano Brown, porta-voz do grupo, clama pela auto-estima da periferia e chega aos corações de seu público ao afirmar que cada um pode trazer a revolução dentro de si. Os Racionais seguem transformadores, raivosos e inquietos, isso sem falar na sonoridade matadora de seu rap, entre o soul e o funk.

Como se não bastasse o impacto do primeiro registro em video do maior grupo de rap do Brasil, o DVD traz ainda, entre os extras, cinco documentários: dois são curtos e tratam dos bastidores do show e de uma gravação em estúdio, enquanto outros dois são de tamanho médio e falam da história do Capão Redondo (Zona Sul de São Paulo, morada de alguns integrantes do grupo) e das perambulações do quarteto na cidade, no Estado e até no exterior (Japão). Neste último surgem momentos reveladores, violentos, divertidos, etc. Mas a cereja do DVD é “O Documentário”, um longa dirigido por Mano Brown que traça um perfil histórico dos mais importantes sobre a cultura negra na cidade de São Paulo numa viagem que começa no século 19. Histórico é pouco, 1000 trutas 1000 tretas é para sempre.

p.s.: O DVD pode ser comprado no
MUBI.
Fonte: Gafieiras

2 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom mesmo o DVD, só faltou mesmo a musica Homem na Estrada e a musica Diario de um detento estar completa.

Anônimo disse...

Pequena Resenha Crítica


“Velocidade da Carne: Livro de Poemas de Marcos Arrais”

“A poesia informa os poetas/(Assim
como a história os profetas)/Insu-
flando sua flama insurgente...”
(Diversos, Waldir Salvadore)



-Nessa fase pós-emepebelização da chamada nova poesia moderna brasileira, que às vezes não é nova, não é poesia, não é moderna e muito menos brasileira, entre cacos e perícias, salvam-se poucos gatos pardos. Uns e ostras. Há poemas e há letras de canção. E assim, vice-versos. Nesse preâmbulo, surge aqui, ali e acolá, um verdadeiro achado entre uma bateia de granizos, na selva de seivas com seus signos ficantes, entre macadames de panelas pseudo-cults e mixórdias letrais, mais certos despoemas, por assim dizer. Na velocidade que está a parnafernália desta abandonada Sampa de tantos brutamontes, em todos os sentidos, tomei de assento o livro de Marcos Arrais, Velocidade da Carne, e, verdade seja dita, tem currículo rico - sem trocadilho - o autor ainda jovem e portentoso. Nascido em 1967 em SP, Físico pela USP, Mestre em Semiótica, premiado pela APCA 95 como compositor (musica instrumental), também é professor de musica formado pela Escola Musical do Município de São Paulo. Nesse tabuleiro de formação, muito se deve esperar dele. E ele confirma-se. Na verdade, Velocidade da Carne, além das chamadas “letras musicais” cheias de sensibilidades reviradas, com Marco Arrais contra-ataca alguma coisa no segredo de si mesmo; coisa que o aprisiona/liberta (libera?) como uma própria impossibilidade que ele resgata (ou tenta resgatar) e assim se divulga também em poemas, como uma espécie de compensação literal, composição poética. E escreve bonito. Musica/Letra.

-Poesia sobre amor/sexo/morte(...). A poesia não salva, nem consola (Celso Favaretto). “Entre a natureza e a cultura, o homem-macaco-marcos tem uma natureza espiritual(...). Com a tocha mágica na mão, há de iluminar seus caminhos...” (Antonio Vicente Seraphin Pietroforte).

-Ei-lo (fragmento):

“Rio tranqüilo, como quem/Entendeu o achado/Uma grande e destruidora/Gargalhada explode (...)” (In, o Destruidor, pg 17)

-Marcos Arrais é assim: o músico que poeta, e, no enlivramento quer dizer o indizível, desconversa e desconserva o tácito incontido (transgressões?), feito um Tarzan (poema da pg 19) que passa pelo surfista de trem (desgovernado/despossuído(...); na viagem do sangue) e assim segue tecendo seus desacertos e achados (íntimos) entre deuses e demônios, compondo também a sua sina sensual entre desarranjos, almas de estúdios, dentro do possível permitido entre a fronteira do oculto medo que dá-se a ver/ler (retraduzir, no que se escreve). Afinal, diz ele “Vida é feito/De um tecido/Muito delicado”(...). O tecido corpóreo da música nem sempre é harmonia e ritmo. Disfonias. Quem lê um livro lê uma obra-músico? Talvez Marcos Arrais seja uma espécie de delicado compondo mosaicos resistenciais na metrópole desvairada com seu violão, sua cabeça, sua sensibilidade ampliada e sua criação para ir além da possível liberdade. Luta do espírito se adequando em si? Ou uma fuga palavreira?.

-Há uma morte in/contada em Marcos Arrais, no acervo letral do seu quadro literário. Uma morte anacrônica, ao mesmo tempo que quase um paradigma; feito um escape sofredor disfarçado de seu lado sentidor, compondo pelaí seu oficio de muito bem poetar. Há um transistor na memória? Uma morte incometida e paradoxalmente incontida (por isso mesmo?), derivando para o irônico aqui, sensual ali, mas sempre querendo refutar no incontível. A carne é fraca. A velocidade da carne é arritmia às vezes. Eis a obra. A palavra tentando decodificar o que a musica não soa porque instrumenta; a poesia é desarquitetural na contemporaneidade insarada desses tempos tenebrosos da geração teflon, querendo calor sem aderência. Marcos Arrais escreve como quem quer tentar decifrar uma esfinge muito além das consoantes, redondilhas, anáforas; entre chipanzés urbanóides sofríveis, debilitados seres-reses incongruentes. A musica se arranja. A poesia acaba virando fio-terra. Dispara. É muito doloroso e triste um desvelo que acaba delírio em terra de muitos brutamontes; entre o neoliberalismo amoral e inumano, na era da pós-globalização insana em campos minados por quadrilhas, estátuas e cofres. Já pensou? Pensar dói. A velocidade da carne disfarça uma metralhadora cheia de música que por si não soa, mas verseja. Relê a vida por isso mesmo. Para um bom escritor os sentimentos podem ser ostras. A mesma carne que aprisiona enquanto epiderme-cela, ao soar (verso e música) dita ritmo de vida, de releitura de vida, como um assento de muito bem assim registrar seu tempo e as amarguras de seu tempo pautado em tantos paradoxos.
-0-
BOX: Velocidade da Carne
Dix Editorial/Editora Annablume
www.annablume.com.br
110 pgs, 2008 Autor Marcos Arrais



Silas Correa Leite E-mail: poesilas@terra.com.br
Site: www.itarare.com.br/silas.htm
Pós-graduado em Literatura na Comunicação (ECA/USP)
Autor de Campos de Trigo Com Corvos, Contos, Editora Design
Blogue: www.portas-lapsos.zip.net