O GÊNIO DA LÂMPADA
Um autor principiante recebe a visita de um gênio da lâmpada, que pergunta: que tipo de escritor você quer ser? Seu desejo será uma ordem, mas é melhor calcular bem a escolha. Vencedor do Prêmio Machado de Assis 2007 na categoria Ficção, Romance, teatro e Conto, e anunciado esta semana como finalista do Jabuti pelo mesmo livro, 'Ela e outras mulheres', Rubem Fonseca trata, neste texto inédito, da virtude essencial para qualquer autor.
por Rubem Fonseca
O Gênio da Lâmpada chegou para o escritor iniciante e perguntou:
Que escritor você gostaria de ser? Aquele que recebe muitos prêmios? Aquele que é festejado pela crítica? Aquele que é um best-seller e vende muitos livros? Você só pode escolher uma dessas opções.
Vou lhe dar algumas dicas, continuou o Gênio da Lâmpada. Quem é muito premiado nem sempre vende bem; o best-seller costuma ser esnobado pela crítica; e existem autores muito festejados pela crítica que são ignorados pelo público.
Vejamos a crítica, prosseguiu o Gênio. O termo crítica, como você não sabe, provém do grego crinein, que significa separar, julgar. Ou seja, o crítico literário é alguém que se acha habilitado a julgar o mérito de um determinado livro, assim como a capacidade do seu autor. A crítica literária foi uma das primeiras críticas de arte a surgirem na imprensa, para analisar contos, romances, poemas. Há autores que gostam de exercer também crítica literária. O Machado foi um deles, assim como Victor Hugo, Émile Zola, e modernamente o Vargas-Llosa, para citar apenas alguns escritores cujas críticas eu li. É claro que a crítica, por mais isenta, é sempre subjetiva. Não existe autor, de Shakespeare a Machado de Assis (Sílvio Romero não poupava "o mulato"), que não tenha sido crucificado pela crítica. O que não impediu, todavia, que eles fossem admirados pelos leitores e espectadores de suas épocas. Isso significa que a crítica não tem importância, que não interfere na vida do autor? Creio que há casos em que a crítica, quando muito negativa, pode prejudicar o autor, principalmente quando ele não confia no próprio talento. Sendo muito elogiativa, mesmo que o encômio não se reflita nas vendas, tem sempre a vantagem de inflar o ego do autor.
E ser um best-seller?, continuou a perguntar o Gênio. Isso deve ser muito bom. Pelo menos ganha-se dinheiro e também celebridade. O diabo é que a crítica não perdoa o best-seller. Preciso citar nomes? Há quem repita o velho clichê: falem mal mas falem de mim. Quem se sente feliz nessa situação deve escolher ser um best-seller. O problema é que chega um momento em que as vendas começam a diminuir, diminuir e o autor de sucesso entra em pânico e verifica, morrendo de inveja, que há outro ou outros ocupando o seu lugar.
E ser muito premiado?, indagou mais uma vez o Gênio. Não vale o Nobel; este é, acima de tudo, um cheque de um milhão de dólares. A maioria dos prêmios tem mais valor honorífico do que fiduciário. É uma honra, sem dúvida, uma bela homenagem receber um prêmio, principalmente concedido por um centro cultural importante. Mas no fundo isso pode ser apenas uma bela ego-trip.
Anda, perguntou o Gênio da Lâmpada ao jovem iniciante, o que foi que você escolheu?
Posso propor uma quarta opção?, o novato indagou por sua vez.
Vá lá, respondeu o Gênio da Lâmpada. Qual é ela?
Eu quero manter sempre uma grande confiança em mim, como escritor e ser humano, não importam os prêmios, os elogios, as vendas, a celebridade.
O Gênio pensou um pouco e respondeu:
Boa escolha. Assim seja.
E a luz da lâmpada, onde se abrigava o Gênio, resplandeceu com um ofuscante fulgor
Fonte: Revista Idiossincrasia
sexta-feira, 29 de junho de 2007
Conto Inédito de Rubem Fonseca
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